Auxílio de Kassab é suficiente para aluguel de quarto minúsculo, quente e malcheiroso

Moradores da Favela do Moinho, incendiada em fim de dezembro, apontam que R$ 300 ao mês não são suficientes e questionam como ficará a vida após o corte do auxílio

Mileide Conceição aceita mudar-se da comunidade do Moinho, mas rejeita ser transferida para um local distante do centro (Fotos: Danilo Ramos/RBA)

São Paulo – O auxílio oferecido pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), aos moradores da favela do Moinho, atingida por um incêndio no último dia 22, é suficiente para alugar um minúsculo quarto ao lado da comunidade, na região central da cidade.

Os moradores, que esperam da administração municipal uma nova proposta, recusaram a ajuda de R$ 300 durante três meses, mais um mês adicional, em um total de R$ 1.200, por considerarem que o valor é muito baixo. Com esta quantia, a única possibilidade de aluguel é de um pequeno quarto, sem camas e sem banheiro, em uma “pensão” ao lado da favela do Moinho, no bairro do Bom Retiro. 

Mileide Conceição Carneiro, uma das 368 chefes de família que, oficialmente, tiveram a moradia atingida pelo fogo, divide o espaço de menos de quatro metros quadrados com dois filhos. O valor de R$ 300 é o mais baixo da região e garante um pedaço de chão com um feltro sujo sobre o qual se sobrepõem dois colchões de solteiro que, somados, ocupam três metros quadrados. O banheiro fica do lado de fora, em um corredor de paredes descascadas no qual se acumulam as roupas de todos os moradores, lavadas em um tanque que guarda uma simpática mensagem escrita a caneta piloto: “Senhor morador, se pensa que vou tá cobrando o aluguel todo mês, se enganou”. 

A comunidade do Moinho fica entre duas linhas de trem metropolitano. O quarto de Mileide fica colado a uma delas. A cada pouco, é preciso parar a conversa para esperar que passe o barulho provocado pela passagem da locomotiva, que se soma ao calor intenso das telhas plásticas e ao mau cheiro que vem de fora. Como, depois de fechados para o público, os trens paulistanos ainda são manobrados e passam por manutenção, o local tem menos de duas horas de silêncio diárias. “Não consigo pensar em nada. Estou com muita raiva de ter perdido minhas coisas todas”, disse Mileide, que há seis meses havia se mudado para a área incendiada, mas antes já havia residido no Moinho. Para comer e tomar banho, ela e os filhos contam com a casa da mãe, também integrante da comunidade. 

Segundo o IBGE, antes do incêndio moravam no local 1.656 pessoas em 532 domicílios. Os 

cálculos dos moradores variam, e no geral incluem o antigo prédio do Moinho, o que aumenta bastante os cálculos e a densidade. Na média, estima-se que cada família seja composta por cinco pessoas, o que, por si, dificulta o aluguel de um quarto. O ideal seria uma casa, mas, com R$ 300 e com a baixa renda da população, nem mesmo nas regiões mais periféricas da cidade, dizem os desabrigados, é possível encontrar uma moradia.

Muitos dos habitantes do Moinho, aliás, foram para lá por não conseguir pagar aluguel. Mudar para outras regiões da cidade também está fora de cogitação para muitas famílias, que têm no centro o trabalho, a escola dos filhos, melhores condições de transporte e atendimento de saúde, condições que capengam – ou faltam – nos bairros mais afastados.

Além disso, permanecer na terra, acreditam muitas famílias, é uma garantia de que não se vai perder a posse do terreno. As administrações José Serra-Gilberto Kassab tentam, via ação judicial, a remoção dos moradores para a construção de um parque no local, uma área que vem se valorizando por conta das promessas de obras públicas que promoverão uma melhoria urbana capaz de atrair a classe média e, com ela, as construtoras.  

Joaniza Pereira não aceita o pagamento de um auxílio-aluguel sem a garantia de transferência para uma moradia

Uma liminar obtida em 2008 garante às famílias a permanência no terreno até o julgamento de uma ação apresentada por elas para a obtenção da propriedade por meio do usucapião, o direito à posse após cinco anos de permanência no lugar. O incêndio, porém, cria uma situação nova que poderia facilitar os projetos da administração municipal. Em assembleia, os moradores recusaram o recebimento da ajuda pública. “Uma amiga minha pegou o auxílio-aluguel. Depois de seis meses, teve de pagar do bolso dela porque não depositavam mais”, conta a empregada doméstica Joaniza Pereira. “Aqui é meu cantinho sossegado. Tudo bem que não é bonito, é debaixo do viaduto, mas é o que dá para fazer. O que ganho não dá para pagar aluguel. É 600 contos um aluguel. Por que não dá um apartamento para a gente morar? Aí a gente pode pagar porque são 60, 80 reais.” 

Leia também

Últimas notícias