Protestos marcam apresentação de projeto final da Nova Luz em São Paulo

Prefeito Gilberto Kassab e aliados apostam em reurbanização que ficará pronta em 2026. Moradores e comerciantes da região da Santa Ifigênia mantêm desconfiança

Kassab afirmou diversas vezes que a questão dos dependentes químicos não está vinculada ao projeto urbanístico. Ativista diz que iniciativa é para “europeu ver” (Foto: Camila Oliveira)

São Paulo – A apresentação do Projeto Nova Luz consolidado pela prefeitura de São Paulo, nesta quinta-feira (11), foi marcada por protestos de moradores da região. Durante o discurso do prefeito Gilberto Kassab (ex-DEM, rumo ao PSD) sobre a versão final da proposta de intervenção no bairro de Santa Ifigênia, já se ouviam reclamações da plateia pela falta de atendimento a dependentes químicos e manutenção de desapropriações e remoções.

A apresentação ocorreu no saguão principal da sede do Executivo municipal, no centro. Sobram dúvidas sobre os prazos reais, já que existe uma ação judicial contra desapropriações e, segundo moradores, a iniciativa precisaria ser aprovada pelo conselho gestor da Zona Especial de Interesse Social (Zeis). O órgão conta com a participação de representantes de moradores e movimentos de moradia, além de funcionários da prefeitura.

O Projeto Nova Luz é uma iniciativa do poder público municipal, mas será implementado por empresas ou grupo de empresas privadas. Ele prevê intervenções urbanísticas com demolições e novas construções em 45 quadras da área delimitada no polígono formado pela rua Mauá e pelas avenidas Ipiranga, São João, Duque de Caxias e Cásper Líbero. A área delimitada pela prefeitura tem atualmente 29 quarteirões.

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O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Miguel Bucalem, passou cerca de 45 minutos expondo alguns aspectos do programa de requalificação. Em linguagem técnica, passando rapidamente pelo detalhamento e sem entrar em pormenores, o secretário de Kassab apresentou as intenções da administração municipal. Ele mostrou mapas e imagens produzidas por computador.

Todo o processo, segundo a prefeitura, durará 15 anos. Pelo menos 380 famílias terão que ser realocadas. Na visão do prefeito, acompanhado por vereadores da base aliada e do ex-governador Alberto Goldman (PSDB-SP), este é um projeto emblemático para a cidade. 

A prefeitura estima dobrar o adensamento populacional na região. Planilha apresentada por Bucalem indica que o bairro terá 23 mil habitantes, ante os atuais 11 mil moradores. O número de trabalhadores deve passar de 23 mil para 42 mil. A prefeitura também espera atrair novos negócios na área de tecnologia e serviços para o local.

Para viabilizar as alterações na área, Bucalem citou que 55% da superfície e 23% da área construída sofrerão transformações. Ele não soube precisar o número de imóveis a serem desapropriados.

Embora sejam favoráveis à requalificação do bairro, moradores, comerciantes e urbanistas se opõem à viabilização do projeto Nova Luz por meio de concessão urbanística. O instrumento  dá poderes a um ente privado de desapropriar mais de 50% da área. Urbanistas alegam que a concessão é inconstitucional já que há regras específicas e apenas o poder público tem poder para desapropriar uma área. A prefeitura já admite a pretensão de expandir o modelo para a região da Pompeia, na zona oeste da capital.

Questionado sobre demolições no bairro, Bucalem evitou falar no assunto, mas justificou o projeto pela necessidade de melhorar a ocupação da área. “Percebemos que esses imóveis tinham potencial de renovação e transformação que isso era benéfico ao projeto. No começo havia mais imóveis, agora só os essenciais (serão demolidos)”, especificou.  Ele também destacou que a região é a mais bem servida de serviços públicos na cidade.

Sem respostas

Segundo lideranças dos moradores, as propostas sugeridas ao poder público não foram incorporadas ao projeto apresentado nesta quinta. Soluções relacionadas aos dependentes químicos não fazem parte das iniciativas na região. Ainda indicam que não houve alterações nas desapropriações de imóveis residenciais e comerciais e remoções de pessoas, apesar da reivindicação de revisão do plano. 

Em entrevista coletiva, Kassab afirmou diversas vezes que a questão dos dependentes químicos não está vinculada ao projeto urbanístico. Para o prefeito, as duas ações são independentes, o Nova Luz existe pela necessidade de reurbanização e requalificação da área, enquanto o atendimento aos dependentes é questão de saúde pública.

“Não pode ser vinculada a questão, seria um desrespeito a essas pessoas (dependentes químicos). O apoio e o atendimento às pessoas independe de qualquer projeto, é uma questão de cidadania”, defendeu Kassab. A presença de usuários de drogas e a estigmatização da região como “cracolândia” – ainda que o tráfico e o consumo de entorpecentes estejam concentrados em algumas vias – são argumentos da prefeitura para a necessidade de intervenção.

Ivanete Araújo, conselheira das Zeis, considerou o projeto “lamentável” e alertou para a expulsão de famílias de baixa renda na área. “É um projeto maravilhoso para europeu ver, mas para quem vive na área ele não tem efeito positivo”, afirmou.

Apesar do clima de finalização do projeto, um morador que não quis se identificar alega que a prefeitura será obrigada a fazer mudanças porque a licitação e a finalização reais dependem dos estudos do conselho gestor das Zeis, que ainda estão em andamento. Kassab disse estar esperançoso que as obras já se iniciem no primeiro semestre de 2012.

Para José Carlos Suzuki, comerciante da região, a revitalização é bem-vinda, mas as desapropriações não serão aceitas em um bairro já consolidado e totalmente regularizado. O julgamento da ação judicial dos comerciantes contra as desapropriações estava marcada para o último dia 3, mas foi adiada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo para o próximo dia 17.

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