Consolidação das Leis Sociais prevê conferências nacionais para criar políticas públicas

Brasília – A proposta da Consolidação das Leis Sociais (CLS) prevê que as políticas públicas sejam elaboradas por meio de conferências nacionais. A informação é de Gerson Luiz de Almeida […]

Brasília – A proposta da Consolidação das Leis Sociais (CLS) prevê que as políticas públicas sejam elaboradas por meio de conferências nacionais. A informação é de Gerson Luiz de Almeida Silva, secretário nacional de Articulação Social, ligado à Secretaria-Geral da Presidência da República – responsável pela elaboração da proposta a ser enviada ao Congresso Nacional, o que está previsto para o mês de março.

A CLS visa dar status de lei a diretrizes de programas sociais definidas em decretos, portarias e atos normativos que podem ser revogados por iniciativa apenas do Poder Executivo.

De acordo com o governo, as recomendações das conferências têm sido fonte fundamental para a elaboração das diretrizes do programa. “Não há caso em que a conferência aponte uma direção e a política pública pegue o caminho contrário”, assegurou Gerson Silva. “Essa experiência de participação, de diálogo social, ajuda a melhorar as políticas públicas”, avaliou. “Com mais acordos, as políticas acabam tendo uma legitimidade superior”, disse.

De acordo com levantamento publicado pela Secretaria-Geral da Presidência, o Brasil realizou, desde 1941, 109 conferências nacionais,  sendo que 60% delas ocorreram entre o primeiro e o segundo mandato do atual governo (2003-2009). A secretaria informou que mais de 4,5 milhões de pessoas se envolveram na realização das conferências nacionais dos últimos oito anos.

Para o cientista político Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), as conferências são “instâncias de agregação”, são “ponto de contato” para uma agenda conjunta entre o governo e a sociedade. Ele disse que as recomendações dos encontros “representam a generalidade de consensos” e citou como exemplo a criação do Sistema Único de Assistência Social (Suas), previsto na 4ª Conferência Nacional de Assistência Social (2003).

O cientista político é o organizador do livro Experiências Nacionais de Participação Social (editora Cortês), publicado no mês passado, que faz um balanço das conferências nacionais e de outros processos participativos.

Avritzer chama a atenção para o fato de o atual governo ter convocado conferências inéditas. Até o fim do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo terá convocado 72 conferências nacionais – dessas, 28 ocorreram pela primeira vez, como é o caso da 1ª Conferência Nacional de Defesa Civil (prevista este ano para o período de 25 a 27/3) e da 1ª Conferência Nacional de Educação (marcada para o período de 23 a 27/4).

A organização das conferências fica a cargo do ministério responsável pelo assunto em discussão. Somente a etapa nacional é custeada pelo orçamento federal que, além do evento, paga a passagem e as diárias dos participantes. Os gastos com as conferências são especificados nas rubricas de exposições, congressos e conferências e de exposições e espetáculos. De acordo com o site Contas Abertas, em 2009 o governo gastou cerca de R$ 250 milhões com a realização de conferências.

Representatividade

Um estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que apesar da concepção democrática e da participação social nas conferências nacionais, a implementação e o aproveitamento das propostas ainda não está claro.

Segundo o estudo Participação Social e as Conferências Nacionais de Políticas Públicas, publicado no ano passado por Enid Rocha Andrade, é necessária a realização de um levantamento que verifique a capacidade do Estado de responder à quantidade expressiva de novas (e antigas) demandas que fazem parte da burocracia estatal.

A pesquisadora cita avaliações de que o governo aumentou, nas conferências nacionais realizadas no primeiro mandato do presidente Lula, os espaços de interlocução com a sociedade civil, mas as conferências ficaram reduzidas à “estratégia de governabilidade” e falta um “método institucional de gestão” das propostas. Segundo pesquisa citada por Andrade, mais da metade dos coordenadores nacionais das conferências não sabia como se dava o processo de encaminhamento das proposições após o evento.

Para cientistas políticos, o sucesso das propostas das conferências depende da representatividade e da articulação. “Quanto mais representativos os setores participantes, mais influente será a conferência”, assinala Valeriano Costa, professor de Ciência Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O professor Leonardo Avritzer, da UFMG, acrescenta que as conferências com melhores resultados são aquelas onde já há uma tradição do processo consultivo, como é o caso das conferências nacionais de Saúde realizadas desde 1941. “Essas são mais ricas”, diz o acadêmico, que também elogia a Conferência Nacional de Segurança Pública que “reivindicou para si a organização da política do setor.”

Além das duas conferências, Valeriano Costa elogia os encontros das áreas de urbanismo (cidades), meio ambiente e educação. “Cada conferência tem lógica diferente. Depende da dinâmica dos conflitos”, analisa.

Próximos governos

O governo Lula foi especialmente mais sensível à realização das conferências nacionais, diz Valeriano Costa. Ele não teme, porém, a interrupção do processo em qualquer cenário projetado a partir das pré-candidaturas  de Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB), Ciro Gomes (PSB), Marina Silva (PV) e Plínio de Arruda Sampaio (P-SOL).

“Não foi o governo Lula que inventou as conferências nacionais. A mobilização faz parte da dinâmica de alguns setores”, ressalta. Na opinião do professor Avritzer, as conferências continuarão ocorrendo, mas “dificilmente ocorrerá a mesma quantidade”.

Algumas estratégias de consulta direta sobrevivem com o passar dos governos, lembra, citando os processos de orçamento participativo já realizados em diversos municípios.
Para o secretário Gerson Silva, o processo das conferências nacionais continuará, independentemente do resultado eleitoral em outubro. “A construção social não anda só para a frente. Essa ideia de participação, no entanto, está muito forte na sociedade brasileira. Durante o processo de redemocratização não houve retrocesso.”.

Segundo ele, “vai ser muito difícil voltar a ideia de que quem governa é apenas o Poder Executivo ou o Legislativo, sem escutar a sociedade”. Silva avalia que a realização das conferências envolve “uma energia social” e pergunta: “ninguém cobra um R$ 1 para mobilizar sua inteligência. Por que deixar de contar com isso?”

Da Agência Brasil