Investigações sobre indígena morto no Mato Grosso do Sul são encerradas com 18 prisões

Após controversas, Polícia Federal admite que cacique Guarani-Kaiowa foi morto, mas o corpo ainda não foi encontrado

Nísio Gomes foi morto no ano passado, quando a comunidade Guaviry, no Mato Grosso do Sul, sofreu um ataque de dez pistoleiros (Foto:Survival)

São Paulo – A Polícia Federal concluiu as investigações para identificar os responsáveis pelo assassinato do cacique Guarani-Kaiowa Nísio Gomes, morto em novembro do ano passado, quando a comunidade Guaviry, próxima ao município de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, sofreu um ataque de dez pistoleiros. As prisões começaram em junho, e nesta semana, de acordo com nota divulgada ontem (20), a PF encerrou a segunda fase do inquérito policial. Foram indiciadas 23 pessoas, das quais 18 estão em prisão preventiva. Entre elas, os cinco fazendeiros que travam o conflito por terra com a comunidade indígena e o proprietário da empresa de segurança Gaspem, o ex-militar Aurelino Arce, de quem os assassinos eram funcionários.

Foi indiciado também um funcionário da Funai por crime de formação de quadrilha e coação de testemunhas, e um indígena, líder guarani de uma aldeia próxima, contratado pelos fazendeiros para atrapalhar as investigações. O funcionário da Funai teria orientado testemunhas a darem informações equivocadas. A PF não pôde informar seu nome porque o processo tramita em segredo de justiça. O líder guarani, por sua vez, dizia que Gomes estava escondido em território paraguaio – a região do massacre é fronteiriça com o país vizinho.

No início de julho, entretanto, ele confessou que Gomes fora de fato assassinado durante o massacre, e que era pago por fazendeiros para dar essa informação equivocada, segundo o delegado da Jorge André Figueiredo, da PF em Ponta Porã, um dos responsáveis pela investigação. “A gente fez várias diligências, com oitivas de testemunhas, pesquisas de campo e contatos com autoridades do Paraguai, o que deu para fazer uma contraposição com algumas informações que ele estava fornecendo. Constatamos que elas não eram verídicas. Chegou um determinado momento, em que ele ficou sem ter o que dizer, não conseguindo encontrar sustentação para a mentira dele”, contou Figueiredo. De acordo com ele, além do dinheiro, do qual boa parte já foi paga, os fazendeiros prometeram ao indígena que promoveriam uma campanha eleitoral para elegê-lo vereador. O nome do indío, a aldeia à qual ele pertence e a quantia de dinheiro prometida são dados que a PF não forneceu.

Agora, resta encontrar o corpo de Nísio Gomes. Segundo a nota da PF, a investigação para localizá-lo é o motivo para os 18 envolvidos permanecerem em prisão preventiva. “Alguns dos fazendeiros presos sabem exatamente onde o corpo estaria escondido”, diz a nota, “no entanto nenhum deles demonstrou interesse em colaborar com as investigações”. Os fazendeiros negam qualquer envolvimento. As defesas de envolvidos, como o dono da empresa de segurança e o presidente do Sindicato dos Ruralistas de Aral Moreira, Osvin Mittank, entraram com pedidos de habeas corpus, que foram negados, e até agora, os advogados não conseguiram tirá-los dos presídios em que se encontram. Ainda falta apurar, também, o exato envolvimento das cinco pessoas indiciadas que não estão presas.

Figueiredo disse que o processo de investigação se deparou com constantes empecilhos, criados pelos fazendeiros, como essas técnicas de fornecer informações erradas. “A experiência no Brasil mostra que quanto maior o poder aquisitivo das pessoas envolvidas mais dificuldades se encontram nas investigações. Esse caso não fugiu essa regra.”

Ele comentou que o resultado do inquérito é um marco na história dos conflitos por posses de terras indígenas no Mato Grosso do Sul. “Nunca tantas pessoas tinham sido indiciadas e presas no estado por terem se utilizado da violência para tentar expulsar indígenas da área de fazendas invadidas. É um exemplo de que a melhor forma é sempre buscar os meios legais existentes para qualquer resolução de conflitos”, disse Figueiredo.

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