Comissão da Verdade ouve conselhos de especialista peruano

Reunido com membros da comissão em São Paulo, Eduardo González Cueva se mostra otimista com o processo de elucidação da verdade histórica no Brasil e sugere transparência, criatividade e apreço ao direito internacional durante as investigações

São Paulo – “Uma Comissão da Verdade funciona melhor quando trabalha de maneira aberta e transparente, em permanente consulta à sociedade.” Esta foi uma das dicas que o especialista peruano em direitos humanos Eduardo González Cueva, diretor do Centro Internacional pela Justiça de Transição (ICTJ), deu aos membros da Comissão Nacional da Verdade reunidos hoje (12) na capital paulista.

“Os resultados são melhores na medida em que os setores organizados forem chamados ao diálogo, e a comissão seja imparcial ao escutar suas demandas”, aconselhou González Cueva, que conversou com a Rede Brasil Atual por telefone após o encontro. Outras duas sugestões foram transmitidas ao grupo de juristas e intelectuais que terão a responsabilidade de apurar as graves violações de direitos humanos cometidas pelos agentes do Estado brasileiro entre 1946 e 1988.

“É fundamental que a comissão se balize pelo direito internacional, que é muito claro ao definir o que pode ser entendido como graves violações aos direitos humanos, quais são os direitos das vítimas e o que é direito à verdade”, recomendou. Mas a comissão também deve ter jogo de cintura: ater-se aos padrões preestabelecidos não significa apenas reproduzir aqui no país os conceitos internacionais.

“A comissão deve ser muito criativa, porque terá de adaptar à realidade brasileira as lições do exterior”, sugere. “Não existem duas comissões da verdade que sejam iguais, não há violações aos direitos humanos que sejam idênticas. O Brasil é um caso único e os membros da comissão terão de encontrar sua própria maneira de trabalhar. A lei lhes dá essa possibilidade.”

Regime de trabalho

Eduardo González Cueva afirma que, durante a reunião, transpareceu nos integrantes da comissão uma preocupação latente com o sistema de trabalho que irão adotar para cumprir com suas responsabilidades. “Estão muito atentos às coisas mais práticas e concretas, e interessados na criação de um plano de trabalho e na divisão interna de responsabilidades”, relata. “É uma preocupação fundamental para poder cumprir com seu mandato de maneira satisfatória.”

O diretor da ICTJ, cuja sede fica em Nova York, conta que os integrantes da Comissão da Verdade também fizeram perguntas sobre seu trabalho na comissão peruana, instalada em 2001. “Quiseram saber qual foram as dificuldades que enfrentamos e conhecer outras experiências latino-americanas.” Assim como a comissão brasileira, a peruana também teve apenas dois anos para apurar violações de direitos humanos.

No entanto, o período histórico alvo da análise de seus integrantes foi menor: 20 anos, entre 1980 e 2000, contra os 42 anos que, diz a lei, deverão ser investigados por aqui. Outra diferença foi o momento político. No Peru, a comissão começou a trabalhar logo depois da queda da ditadura liderada por Alberto Fujimori, que governou entre 1990 e 2000. No Brasil, as apurações oficiais estão começando após 27 anos de terminado o regime de exceção (1964-1985).

“Temos muita confiança no processo brasileiro”, avalia Eduardo González Cueva. “A lei que criou a comissão é adequada e permitirá que seus membros investiguem com profundidade. A presidenta Dilma Rousseff levou bastante tempo para escolher seus integrantes e convidou pessoas capacitadas para fazer o trabalho.” O especialista peruano comemora o interesse crescente da sociedade brasileira, sobretudo dos jovens, em conhecer a verdade e a memória histórica. “Vários estados também criaram suas comissões, e isso permitirá uma cooperação bastante útil.”

 

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