Reintegração de prédio ocupado em São Paulo deixa 200 sem moradia

Famílias deixaram pacificamente o prédio que ocupavam na região central da cidade e montaram acampamento em frente ao local para aguardar atendimento da prefeitura

Criança permanece na calçada após a reintegração de posse (Foto: ©Anderson Barbosa/FotoArena/Folhapress)

São Paulo – A Polícia Militar cumpriu na manhã desta sexta-feira (29) uma sentença de reintegração de posse que deixou 200 pessoas, incluindo crianças e idosos, sem moradia. As famílias de sem teto ocupavam um prédio em condições precárias na alameda Nothmann, em Campos Elíseos, na região central. Os moradores deixaram o prédio pacificamente e decidiram montar um acampamento em frente ao imóvel para aguardar um posicionamento da prefeitura sobre atendimento habitacional para as famílias.

A decisão judicial foi tomada na terça-feira (26) pela juíza Márcia Cardoso, da 37ª Vara Cível de São Paulo. Segundo a sentença, “o imóvel é conhecido pela Secretaria Municipal de Habitação como objeto de ‘assentamento'”.

Antes da retirada, Benedito Roberto Barbosa, o Dito, um dos coordenadores da União dos Movimentos de Moradia (UMM), foi levado para o distrito policial acusado de desacato a autoridade. Ele é a referência de negociações entre as famílias e a polícia. Sem ter acesso a alimentação, um ativista do movimento atirou um saco de pão para o alto, em direção às janelas do prédio. Antes que Dito atirasse outro pacote, com o mesmo objetivo, foi agarrado por três policiais e encaminhado para a delegacia. O líder já foi liberado, mas registrou boletim de ocorrência contra a Polícia Militar por excesso na prisão.

O defensor público Douglas Tadashi Magami considera a detenção de Dito “um ato que se traduz em uma criminalização dos movimentos sociais”. Ele explica que se as pessoas não forem sequer encaminhadas a abrigos provisórios, onde a defensoria poderia entrar com ação cívil pública contra a prefeitura.

Ocupantes relataram que não têm para onde ir e que dependem do local para não voltar a morar nas ruas. A líder da ocupação, Maria Carmelita Santos de Jesus, diz que as famílias não vão sair da calçada na frente do prédio reintegrado sem ter uma moradia definitiva ou o atendimento por meio do bolsa-aluguel.

Ela conta que o documento de aviso da reintegração de posse chegou há oito dias e que, na quarta-feira (26) foram abordados por funcionários de prefeitura que ofereceram vagas em albergues. “As famílias não tem para onde ir, são todas pessoas carentes que precisam de apoio. Vamos permanecer aqui na calçada até a prefeitura resolver a situação.” afirma Carmelita.

Segundo a advogada Juliana Avanci, o processo judicial tem fragilidades, já que estariam faltando documentos de comprovação de posse por parte do autor da ação, como recibo de pagamento do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) ou outro tributo relacionado ao imóvel. A peça seria baseada em um boletim de ocorrência. Além disso, o prédio estava abandonado, segundo os sem teto.

Ocupação

De dois andares e sem manutenção, o prédio era dividido entre as famílias, garantindo a cada uma seu espaço. Havia pouca iluminação nos corredores e, segundo moradores, fazia menos de dois meses que a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) havia religado o fornecimento de água. Muitos moradores trabalham como catadores de material reciclável, e os que estão desempregados são ajudados pelos vizinhos de ocupação.

Michel Anjos José da Silva vivia no local com a mulher e três filhos há oito meses. “Vim da Bahia e acabei perdendo meu emprego porque meu filho ficou doente e minha mulher de barriga (grávida), tive de cuidar dele” conta, emocionado.

Outro morador, Jeferson de Paula Gomes, relata que vive nas ruas há mais de 20 anos e não tem outro destino aonde ir com a esposa. Ele começou a trabalhar em julho para uma empresa que presta serviços à prefeitura mas não recebeu ainda o primeiro salário. “Eu gosto de trabalhar, nunca fiz nada errado. Na rua, roubam nosso documentos e nossas coisas. Antes daqui fiquei um bom tempo dormindo com a minha mulher na praça da Sé. Só quero ter onde morar”, desabafa.

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