Microfone, a arma dos paraguaios
De um dia para o outro, um presidente eleito é destituído. Mas a resistência se articula
Publicado 12/07/2012 - 15h29
No lugar de tanques do Exército, o Parlamento. Assim se deu o golpe de Estado no Paraguai, em 22 de junho. Os votos de deputados e senadores, em poucas horas, decidiram pelo impeachment do presidente Fernando Lugo. As manifestações em frente ao Congresso foram duramente reprimidas.
No dia seguinte ao golpe, ao chegar em Assunção, imaginei deparar com protestos por toda parte. Nada disso. O clima era de feriado, pouca gente nas ruas, comércio parcialmente fechado. Onde estaria a indignação dos paraguaios diante do golpe?
A aparente calmaria foi quebrada à noite, em frente à TV Pública Paraguay, onde centenas de jovens se reuniram para protestar no programa Microfone Aberto. O microfone, instalado na calçada, estava aberto para quem quisesse protestar, ao vivo. Já havia censura do governo de Federico Franco contra a televisão, mas os funcionários não se intimidaram e continuaram a transmitir a programação. De braços dados, enfileirados em uma das esquinas, os jovens fecharam a rua para impedir a entrada da tropa de choque na emissora pública. “Nenhum passo atrás”, gritavam os manifestantes. O clima era tenso, mas não houve confronto.
Já era perto de meia-noite, com a presença de aproximadamente mil pessoas, o cidadão Fernando Lugo chegou de surpresa. Usou o microfone, denunciou o pouco tempo que teve para se defender no processo de impeachment e depois concedeu uma entrevista coletiva à imprensa internacional, nos estúdios da emissora. A Rádio Brasil Atual, da Rede Brasil Atual, era o único meio de comunicação brasileiro presente. A fala do presidente foi transmitida ao vivo pela TV.
dias no Paraguai após a queda de Lugo.
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Por Mauro Santayana
Nos dias seguintes, paraguaios de todas as idades passaram a frequentar o programa. A TV Pública se tornou o foco de resistência urbana no Paraguai. Até um “restaurante solidário” foi montado na rua. Mulheres voluntárias cozinham para alimentar os manifestantes.
Com a reação popular, o presidente deposto instala um governo paralelo. É lançado o movimento Paraguay Resiste. Lugo se encontra, na Central Nacional de Trabalhadores (CNT), com membros da Frente Guasu, que o apoiou rumo à Presidência da República, e com integrantes da Frente pelo Retorno da Democracia no país. Lugo recebe o apoio da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e do Mercosul, que aplicam sanção política contra o Paraguai, é ouvido pelo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, e resolve percorrer o interior do país para explicar aos paraguaios os reais motivos do golpe parlamentar.
Com a implantação da saúde gratuita, do programa Tekoporã, uma espécie de bolsa-família, e de uma contribuição às pessoas da terceira idade, Lugo tem o apoio da parcela pobre da população. Mas como o retorno ao poder é praticamente impossível, segundo assessores do presidente deposto, o foco agora é a eleição para a Presidência e o Senado, em abril de 2013. Lugo, que possivelmente encabeçará a lista dos candidatos a senador, deve decidir, entre seis nomes da Frente Guasu, o mais adequado para concorrer às eleições.
O mais cotado é o jornalista Mário Ferreiro, pelo bom desempenho nas pesquisas de intenção de voto e por sua popularidade, já que é apresentador de televisão. Outro nome forte é a ex-ministra da Saúde Esperanza Martinez, que ganhou força por ter implantado o programa gratuito de saúde no país. O temor agora passa a ser em relação às fraudes no processo eleitoral e até o impedimento da candidatura de Lugo ao Senado.