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O pesadelo Yeda

Atolado em denúncias de corrupção, modelo tucano paralisa o Rio Grande do Sul

Daniel Marenco/Folha imagem

Yeda e seu séquito: para os tucanos, investigação só é boa na esfera federal

Um fato divulgado muito discretamente pela imprensa gaúcha serve de exemplo da situação do governo de Yeda Crusius (PSDB) no Rio Grande do Sul. No dia 19 de outubro, o site Coletiva.net (www.coletiva.net) divulgou a contratação, pelo PSDB, da empresa FSB Comunicações, sediada em São Paulo, para ajudar a melhorar a imagem do governo tucano. Daniel Andrade, que acumulava então as funções de secretário-geral do PSDB local e secretário estadual de Infraestrutura, coordenou a negociação com o escritório paulista. Entre as ações previstas para “construir um modelo de governo para o partido”, estão “sugerir pautas, orientar agendas e avaliar diariamente o noticiário político veiculado nos meios de comunicação”. O valor do contrato, conforme a mesma fonte, é de R$ 240 mil, por seis meses, e “não implica a ida de funcionários da FSB a Porto Alegre”. Ou seja, segundo essa versão oficial, o PSDB contratou uma empresa de São Paulo para “construir um modelo de governo para o partido” no final do terceiro ano de governo tucano no Rio Grande do Sul. E essa “construção” poderá se dar a distância.

A terceirização da função definidora de um governo, eleito com o lema “um novo jeito de governar”, fornece um nítido e eloquente retrato da situação política. Atolado em denúncias de corrupção, o governo Yeda Crusius está totalmente paralisado, e paralisando o estado inteiro. Sua principal atividade, nos últimos meses, foi procurar defender-se das pesadas acusações de corrupção vindas de vários órgãos de fiscalização e movimentar sua base parlamentar para evitar que as investigações da CPI da Corrupção e o processo de impeachment, movido pelo Fórum dos Servidores Públicos, avançassem na Assembleia Legislativa. Yeda tem sólida maioria no Parlamento e vem se valendo dela para barrar as investigações do maior escândalo de corrupção da história dos pampas.

No dia 14 de outubro, a governadora conseguiu um alívio com a decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, excluindo-a da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal. A decisão não entrou no mérito da ação que acusa a governadora de envolvimento com a fraude de R$ 44 milhões no Detran gaúcho. Segundo entendimento do TRF, “a governadora, como agente política, não pode responder por improbidade administrativa, mas apenas em caso de crime de responsabilidade”. O MP Federal anunciou que vai recorrer da decisão no Supremo Tribunal Federal (STF).

Rodin e Solidária

Mesmo com esse respiro e com a ação da sua base parlamentar na Assembleia, a governadora tucana segue em maus lençóis. Quase no mesmo momento em que o PSDB e seus aliados (PMDB, PTB, PP e PPS) comemoravam a decisão do tribunal, o procurador-geral do Ministério Público de Contas, Geraldo da Camino, pedia uma inspeção extraordinária nas contas da Casa Civil e da Casa Militar para identificar, item por item, o que foi comprado com recursos públicos para a residência de Yeda. O tema veio à tona na CPI da Corrupção. No início de 2007, a governadora reformou e mobiliou sua casa com recursos públicos. As compras incluíram itens como lençóis, almofadas, toalhas, móveis infantis e piso emborrachado para garagem.

Além disso, investigações em curso no âmbito da Procuradoria-Geral da República sobre a compra da casa da governadora em uma área nobre de Porto Alegre, logo após o final do segundo turno em 2006, podem gerar a abertura de um processo criminal contra ela.

Os dois principais focos de denúncias contra o governo do PSDB giram em torno das Operações Rodin e Solidária, desencadeadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal. Segundo estimativas preliminares das autoridades, as fraudes investigadas pela Solidária envolvem valores cerca de sete vezes maiores que os da fraude no Detran, podendo chegar a R$ 300 milhões.

A Solidária nasceu em novembro de 2007, no mesmo mês em que a Operação Rodin apontava a existência de um esquema criminoso no Detran, com a participação de importantes funcionários do governo Yeda Crusius. Surgiu a partir da investigação da terceirização do fornecimento de merenda escolar em Canoas, durante a administração municipal de Marcos Ronchetti (PSDB). O lema da gestão tucana em Canoas, “Administração Solidária”, deu nome à operação que descobriu fortes indícios de fraudes em licitações para obras de saneamento, construção de estradas e sistemas de irrigação.

Os casos foram de início tratados separadamente. O desenvolvimento das investigações acabou revelando evidências de conexão entre os dois esquemas. Nomes de envolvidos na fraude do Detran passaram a aparecer também nas investigações da Solidária. Por essa razão, a Justiça Federal autorizou, em 2008, a pedido do MP Federal, o compartilhamento de informações entre as operações. O ex-secretário-geral da administração Ronchetti, Chico Fraga, teve telefonemas gravados com autorização judicial. Ele é réu no processo do Detran e um dos principais investigados na Solidária, que levantou um patrimônio de mais de 25 imóveis e mais de uma dezena de veí­culos em seu nome.

No dia 25 de março deste ano uma reportagem da revista IstoÉ tratou do envolvimento do deputado federal Eliseu Padilha (PMDB) no caso. Segundo o texto do repórter Hugo Marques, investigações da Polícia Federal e do MP Federal descobriram um depósito de R$ 267 mil da empresa Magna Engenharia na conta da empresa Fonte Consultoria Empresarial, cujos sócios são Eliseu Padilha e sua mulher, Maria Eliane. Um inquérito que tramita sob segredo de Justiça no STF investiga o envolvimento de Padilha em crimes de tráfico de influência e fraude em licitações. A investigação envolve também o deputado estadual e ex-presidente da Assembleia Legislativa Alceu Moreira (PMDB) e o secretário estadual de Habitação, Saneamento e Desenvolvimento Urbano, Marco Alba (PMDB).

A conexão Padilha-Chico Fraga é um dos aspectos mais importantes dessa investigação. Os dois tiveram grande influência na formação do governo Yeda e foram consultados em decisões sobre definições de cargos. Todas as licitações importantes passavam pelas mãos de Chico Fraga, como secretário-geral da Prefeitura de Canoas. Padilha está sendo investigado por indícios de envolvimento em fraudes de licitações nesse município e em outros. Os dois estão umbilicalmente ligados nesse caso que pode revelar um dos maiores esquemas de fraude e desvio de recursos públicos da história do Rio Grande do Sul.

Outro nome envolvido na investigação é o de Walna Vilarins Meneses, principal assessora de Yeda Crusius. Ela foi indiciada pela PF pelos crimes de corrupção passiva e formação de quadrilha. Walna é acusada de interferir no resultado de licitações em favor de algumas empresas. Em ligações telefônicas, conversa com Neide Bernardes, representante da Magna Engenharia, uma das empresas investigadas pela Solidária sob suspeita de pagar propina para agentes públicos em troca da interferência em licitações.

Essas ramificações, envolvendo figuras importantes do PMDB gaúcho, o maior partido da base aliada de Yeda, ajudam a entender por que as investigações não avançam na Assembleia. É a sobrevivência política da aliança PSDB-PMDB que está em jogo no estado. 

 

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