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Do tamanho do Rio ou do Brasil?

Clubes cariocas tentam driblar as dificuldades financeiras para provar que podem fazer bonito não só no Estadual, mas também no Brasileirão

Celso Pupo/FOTOARENA/Folha Imagem

Torcida do Flamengo durante Fla-Flu pela Taça Rio, segundo turno do campeonato estadual: foi em 1992 que o time carioca se tornou campeão brasileiro pela última vez

Mais de 60 mil torcedores no Maracanã nos jogos decisivos e com Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco disputando palmo a palmo o título de campeão. O Estadual do Rio de Janeiro empolgou como há muito não se via. Os quatro grandes dominaram o campeonato e não deram chances aos pequenos. O Resende só se intrometeu na semifinal da Taça Guanabara porque o “tapetão” tirou seis pontos do time de São Januário por causa da escalação irregular do meia Jéferson.

O domínio dos quatro principais clubes não acontecia no Rio de Janeiro dessa maneira desde 2001, quando o Flamengo foi campeão, vencendo o Vasco na final, o Botafogo foi o terceiro e o Fluminense o quarto. Em 2008, os quatro também chegaram às semifinais tanto da Taça Guanabara quanto da Taça Rio, mas o campeonato não foi disputado em igualdade de condições, já que os pequenos não puderam enfrentar os grandes no próprio estádio.

Há oito anos os cariocas não terminavam tão bem o Estadual. O Flamengo superando muitas dificuldades, o Botafogo ressurgindo das cinzas, o Fluminense apostando em estrelas como Fred, Thiago Neves e Carlos Alberto Parreira e o Vasco, apesar da goleada sofrida na semifinal da Taça Rio, fazendo uma campanha muito melhor do que o mais otimista de seus torcedores acreditava ser possível depois do rebaixamento do clube para a Série B do Campeonato Brasileiro – por onde já andaram o Fluminense, no final da década passada, o Botafogo, em 2003, e com a qual o Flamengo andou flertando várias vezes, safando-se nas rodadas finais. 

É justamente o fracasso dos clubes de maior torcida do Rio no cenário nacional que deixa torcedores e críticos ressabiados. O último a triunfar na primeira divisão do Brasileiro foi o Vasco, em 1997 e 2000. Este século, portanto, é de jejum na principal competição. A situação chama a atenção do mundo do futebol porque, afinal, trata-se de times populares em todo o país. O mais popular cantor brasileiro, por exemplo, já torceu por três deles. Roberto Carlos começou nutrindo simpatia pelo Flamengo, virou botafoguense e acabou adotando o Vasco – isso tudo quando vivia em Cachoeiro do Itapemirim, cidade do interior do Espírito Santo, que tinha lá seus próprios times de tradição.

Será que agora o bom futebol jogado pelos grandes cariocas no Estadual os credencia a disputar o mais importante título nacional?

Pé atrás

“É difícil dizer isso agora, mas o Estadual engana demais”, afirma o jornalista Fernando Calazans, colunista do jornal O Globo. “Diferentemente do que aconteceu nos últimos dois anos, não acredito que nenhum time do Rio tenha condições de brigar para ser campeão brasileiro”, sentencia Paulo Vinícius Coelho, o PVC, colunista da Folha de S.Paulo.

A opinião do jornalista justifica-se nos problemas financeiros comuns aos quatro: “Flamengo e Fluminense esbarram na fuga da realidade. Os dois têm elencos caros e,  por causa disso, dificuldades para manter em dia os pagamentos. Muitos problemas começam com o atraso de salários. Por outro lado, o Botafogo adotou uma política pé-no-chão para não ficar em dívida com o elenco, mas isso significa time modesto. No máximo, vão conseguir namorar vaga para a Libertadores”.

A fragilidade financeira dos clubes do Rio de Janeiro ficou comprovada no fim de 2008. O êxodo de jogadores foi grande, mas o destino não foi o exterior. O único atleta que foi jogar fora do país foi Thiago Silva, contratado pelo Milan. O São Paulo levou Washington, Arouca e Júnior César do Fluminense, Wagner Diniz do Vasco e Renato Silva do Botafogo, que ainda perdeu para o Corinthians Túlio e Jorge Henrique –  além de seu artilheiro Wellington Paulista, para o Cruzeiro –, enquanto o Santos ficou com Lúcio Flávio e tirou Madson de São Januário.

O único que não perdeu jogadores para os paulistas foi o Flamengo, mas os problemas rubro-negros começaram na virada do ano. Com uma dívida que beira os R$ 300 milhões, o clube não conseguiu renovar o contrato de patrocínio com a Petrobras por não ter as certidões negativas de débito necessárias para assinar com a estatal, que já havia acertado o valor de R$ 14 milhões para 2009.

A parceria de 25 anos acabou e o Flamengo corre atrás de um novo patrocinador. Sem o dinheiro da Petrobras e com cotas da televisão de 2009 adiantadas, a situação ficou caótica. Marcelinho Paraíba não aguentou os salários atrasados e transferiu-se para o Coritiba. “Acreditei na diretoria, que prometeu cumprir tudo o que foi combinado no meu retorno. Mas as coisas não aconteceram como eu esperava. Estava na Europa com a minha vida estabilizada e só aceitei jogar no clube porque sou flamenguista”, lamentou o meia.

O clube da Gávea encontra ainda dificuldade para segurar seu principal jogador, o meia Ibson, cujos direitos federativos pertencem ao Porto. O clube português não quer prorrogar o empréstimo, que expira no meio do ano, e os R$ 12 milhões exigidos para negociá-lo em definitivo são muita coisa para os padrões da Gávea.

Se a falta de patrocinador atormenta os flamenguistas, a presença de um parceiro forte salva o Fluminense. A Unimed garantiu a contratação de Fred e a volta de Thiago Neves. A empresa paga o salário de 20 dos 32 jogadores do elenco tricolor, e é aí que reside o problema.

O salário de quem recebe pela Unimed está sempre em dia. Já quem depende do clube para receber corre o risco de ficar a ver navios por alguns meses. Foi o que aconteceu com o lateral-esquerdo Leandro. Contratado em janeiro, só foi receber pela primeira vez em março. “Isso cria um desequilíbrio muito grande dentro do grupo de jogadores”, analisa PVC. Fred trocou o Lyon, da França, pelo Fluminense para receber nas Laranjeiras R$ 450 mil mensais, pagos religiosamente, enquanto outros jogadores penam para ver a cor de valores bem menores.

Pé no chão

Para problemas desse tipo, o Botafogo optou por um caminho completamente diferente. O Alvinegro terminou 2008 com quatro meses de salários atrasados. Na reta final do Brasileirão, quando ainda sonhava com uma vaga na Libertadores, perdeu Carlos Alberto, que rescindiu o contrato quando chegou a 90 dias sem receber.

Para 2009, o presidente Maurício Assumpção assumiu o posto no lugar de Bebeto de Freitas, que deixou o cargo em dezembro, e apostou numa política de contenção de despesas. “Era a única maneira de tornar o Botafogo viável. Não tínhamos alternativa.”

A primeira medida foi reduzir os gastos com o futebol. Dos R$ 2,6 milhões mensais de 2008, o valor caiu para R$ 1,6 milhão. A economia vai chegar a R$ 12 milhões ao final de 2009. Para isso acontecer, o clube perdeu jogadores importantes. Mas contou com o olhar clínico do técnico Ney Franco para trazer atletas bons e baratos. O time achou Victor Simões na Coreia do Sul e o atacante revelado pelo Figueirense não só deu conta do recado como fez muitos gols. Assim como Maicosuel, que, depois de uma temporada apagada no Palmeiras, começou a brilhar em General Severiano. Além disso, recuperou Juninho, que teve um ano ruim no São Paulo, trouxe Reinaldo para ser a estrela da companhia, e apostou em caras desconhecidas como Fahel, Wellington, Batista e Léo Silva, que deram boa resposta dentro de campo.

O diferencial do Botafogo? Os jogadores têm hoje a certeza de que no final do mês vão receber o combinado, mas só isso não basta para entrar no Brasileirão em condições de brigar pelo título.

O clube que deve ter a vida mais tranquila em 2009 é o Vasco. O objetivo da temporada é retornar à primeira divisão do Campeonato Brasileiro, e a campanha feita no Estadual credencia a equipe. “O Vasco vai subir. Talvez não seja tão tranquilo quanto foi para o Corinthians, mas o Vasco sobe. O clube fez uma aposta certa no Dorival Júnior”, acredita Paulo Vinícius Coelho.

Depois de uma estreia muito ruim, quando perdeu para o Americano por 2 a 0, o Vasco embalou seis jogos de invencibilidade na Taça Guanabara e só não se classificou por causa do erro cometido pela direção na inscrição de Jéferson, que ocasionou a perda de seis pontos. Na Taça Rio, o time foi arrasador. Venceu todos os oito jogos da fase de classificação, inclusive contra Flamengo (2 a 0) e Botafogo (4 a 1), e só caiu na semifinal com uma dura derrota por 4 a 0 para o Botafogo.

O que pode atrapalhar são os problemas extracampo. As dificuldades financeiras também são muitas. No fim de 2008, um contrato salvador de patrocínio foi anunciado. A Eletrobrás aceitou estampar sua logomarca na camisa cruz-maltina. Mas o clube demorou mais de quatro meses para conseguir as certidões negativas para que o contrato, no valor de R$ 14 milhões anuais, pudesse entrar em vigor.