Amizade antiga

Comissão do Senado criada para apurar situação dos Yanomami é presidida pelo bolsonarista Chico Rodrigues

Senador já foi flagrado pela PF com R$ 33 mil na cueca, empregou Leo Índio, primo dos filhos de Bolsonaro, e tenta defender garimpeiros. “Não se pode fechar os olhos para as consequências da ação ilegal dos garimpeiros”, rebate Humberto Costa

Marcos Correa/PR
Marcos Correa/PR
Senador foi vice-líder de Jair Bolsonaro no Senado e caiu por ter sido alvo da Polícia Federal em operação de 2020

São Paulo – A Comissão Temporária sobre a Situação dos Yanomami, instalada no Senado nesta quarta-feira (15), já começou a existir sob condições duvidosas. Eleito presidente do colegiado, o senador Chico Rodrigues (PSB-RR), de comprovado histórico bolsonarista, prometeu um trabalho isonômico entre indígenas e garimpeiros, segundo a Agência Senado. A comissão teria a função de fiscalizar a saída dos garimpeiros da reserva em Roraima.

Nas palavras de Rodrigues, esse caráter de igualdade de tratamento seria necessário em um cenário jurídico de “proteção a todos aqueles que são cidadãos brasileiros: os indígenas yanomamis e aqueles garimpeiros que estão na área”. A colocação soa estranha. Garantir isonomia entre yanomamis e garimpeiros não é exatamente o que se espera de uma comissão legislativa diante da tragédia de um povo provocada exatamente pelo garimpo em sua atividade criminosa.

Os argumentos de Rodrigues não são questionáveis apenas quanto à isonomia, mas também pelo modo como ele aborda o problema dos invasores da reserva indígena. Ele defendeu o cadastro dos garimpeiros em programas sociais com um argumento carregado de simbologia bolsonarista.

“Se formos traçar um paralelo hoje, os refugiados venezuelanos recebem os benefícios dos programas sociais do governo. Então, imaginem os garimpeiros, que são brasileiros? Precisam também, até para mitigar o sofrimento que vão ter naturalmente quando saírem daquelas áreas”, disse.

O senador Humberto Costa (PT-PE), que também é membro da comissão, rebateu o posicionamento de Chico Rodrigues. E destacou que é preciso olhar principalmente para a realidade do povo yanomami, “que é um povo desnutrido, sem assistência, faminto”. Costa defendeu que “não se pode fechar os olhos para as consequências da ação ilegal dos garimpeiros naquele território”.

Chico Rodrigues apareceu nas manchetes em outubro de 2020, quando foi flagrado pela Polícia Federal (PF) com R$ 33 mil escondidos na cueca e uma suposta pepita de ouro. Aquela operação tinha o objetivo investigar desvios de recursos públicos destinados ao combate à pandemia da covid-19. Por causa do episódio, Rodrigues caiu do posto de vice-líder do governo Bolsonaro no Senado, que ocupava então.

O hoje presidente da comissão sobre a Situação dos Yanomami é personagem de um vídeo que apareceu nas redes sociais nessa mesma época. Embora sem identificar data, a gravação antiga mostra Rodrigues com Jair Bolsonaro, num cenário semelhante a um gabinete, adornado com bandeiras do Brasil e do estado de São Paulo.

“Meu amigo Jair Bolsonaro”

“Olá, amigos de Roraima. Estou recebendo hoje aqui o Chico Rodrigues, que vocês tanto conhecem. Chico, com a palavra”, diz Bolsonaro. “Eu quero aqui agradecer o meu amigo Jair Bolsonaro, de 20 anos de Câmara dos Deputados”, respondeu Rodrigues na gravação. “É quase uma união estável, hein, Chico”, afirmou ainda Bolsonaro, interrompendo o interlocutor, ambos entre largas risadas.

Rodrigues já empregou Leo Índio, primo dos filhos de Bolsonaro, em seu gabinete no Senado, como assessor parlamentar. Índio foi alvo de busca e apreensão da Operação Lesa Pátria, que investiga participantes do ataque de 8 de janeiro a Brasília, no dia 27 de janeiro. Segundo a Repórter Brasil, o senador era dono de um avião que circulava em garimpo ilegal em 2018.

Apesar do perfil do presidente, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), vice-presidente da comissão, acredita que o colegiado tem obrigação de chegar a resultados e está otimista.

“Comissão chegará aos responsáveis”

“A comissão externa do SF (Senado Federal) vai chegar aos responsáveis pela tragédia q feriu de morte os Yanomami. Vamos apontar culpados e sugerir políticas públicas eficazes. Uma tragédia como essa ñ pode se repetir mais. Os povos originários precisam ser protegidos da gana por dinheiro e poder”, postou a parlamentar no Twitter (mantida ortografia original).

Além de Rodrigues, Humberto Costa e Eliziane, os outros membros da comissão, composta por cinco titulares são Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e Dr. Hiran (PP-RR).

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