DECISÃO DA 1ª TURMA

STF considera áudios de Joesley válidos como provas e transforma Aécio em réu

Decisão de acolher abertura de processos contra o senador por corrupção e obstrução de Justiça torna ainda mais frágil situação de Temer, que pode ser alvo de uma terceira denúncia até junho

Nelson Jr./SCO/STF

Para o relator Marco Aurélio, é possível detectar, nos áudios, “tentativa de embaraço às investigações”

Brasília – Depois de muita expectativa e meses de discussão em torno do tema, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou válidos ostrechos da gravação feita pelo empresário Joesley Batista em conversas com Michel Temer (MDB) e o senador Aécio Neves (PSDB-MG), divulgados em abril passado. Assim, a primeira turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República contra Aécio Neves, que a partir de agora é réu em duas ações penais: a primeira por corrupção passiva e a segunda por obstrução de justiça.

Assim que soube do resultado, o senador fez um curto pronunciamento no Congresso Nacional e se recolheu ao gabinete. Disse, em relação ao processo por corrupção, que estão tentando dar um caráter de ilegalidade a um ato privado, que consistiu, segundo ele, em um empréstimo tomado junto ao empresário Joesley Batista. O parlamentar afirmou ainda que o recurso recebido por ele “não lesou ninguém e nem envolveu dinheiro público”.

Já no tocante à segunda ação penal, Aécio criticou o fato de que ações do seu trabalho dentro do Senado tenham sido consideradas como tentativa de obstrução. E reclamou que “à atuação parlamentar não cabe esse caráter”. Ele adotou uma tática que está se tornando comum no Palácio do Planalto nos últimos tempos: se manifestou, diante dos inúmeros pedidos cobrando uma fala sua, mas evitou responder a qualquer pergunta feita pelos repórteres.

Apesar da tentativa dos advogados de defesa de descaracterizar os áudios e o comprometimento da conversa entre o senador e o empresário, o resultado do julgamento já era dado como certo. O colegiado acolheu, da mesma forma, a abertura de processos contra a irmã do parlamentar, a jornalista Andrea Neves, e o primo de ambos, Frederico Pacheco de Medeiros. Medeiros, conhecido como Fred, foi filmado recebendo uma mala com R$ 2 milhões de um representante de Joesley Batista.

Sem desmembramentos

Os magistrados, entretanto, recusaram dois itens que também foram discutidos. O fatiamento do processo para que Andrea e Frederico fossem julgados na primeira instância e que fossem levadas em conta provas ligadas a outras investigações que tiveram a participação do ex-procurador Marcello Miller (acusado de ter assessorado Joesley Batista no pedido de delação antes mesmo de deixar o cargo, num caso que levou ao cancelamento da delação do empresário). Eles consideraram que o desmembramento do processo poderia prejudicar seu julgamento na Suprema Corte e destacaram que não devem ser usadas informações relacionadas à atuação de Miller.

Para o relator do caso no tribunal, ministro Marco Aurélio de Mello, pelo que foi apurado é possível detectar, nos áudios, “tentativa de embaraço às investigações na pressão exercida sobre membros do governo e da Polícia Federal para escolher delegados com o objetivo de conduzir os inquéritos da Operação Lava Jato”. A denúncia de corrupção foi aceita por unanimidade, enquanto a de obstrução de Justiça foi aprovada por 4 votos a 1, com o voto contrário de Alexandre de Moraes.

O subprocurador da República Carlos Alberto Coelho deu parecer bastante duro pelo acolhimento da denúncia, argumentando que “existe farto material probatório no caso”. “Não há dúvidas de que o empresário apenas aceitou pagar R$ 2 milhões a Aécio Neves porque este ocupava o cargo de senador da República. Os autos deixam claro que não fez o pagamento por prodigalidade, altruísmo ou solidariedade e sim, porque sabia que Aécio estava pronto para prestar contrapartidas”, afirmou.

Respingo em Temer

A decisão agrava a situação do parlamentar mineiro, que já chegou a ser afastado do Senado e da presidência nacional do PSDB – ele voltou ao cargo depois de ter decisão revogada por meio de decisão monocrática (individual) do ministro Marco Aurélio. Mas respinga também no presidente da República, Michel Temer, pelo fato de tornar sua situação cada vez mais crítica.

Embora Temer não tenha sido objeto de qualquer processo em pauta hoje e tenha tido duas denúncias contra ele rejeitadas pelo plenário da Câmara dos Deputados no ano passado, justamente em função dos mesmos áudios, a posição dos magistrados de que o conteúdo destas gravações pode ser utilizado como prova deixa o presidente mais frágil perante a Justiça.

Em reservado, foi comentado entre vários juristas e advogados que acompanharam a sessão que é muito difícil, depois disso, o presidente não vir a enfrentar uma ação sobre o tema posteriormente, quando deixar o cargo.

Além disso, é tido como certo o envio, até junho, de nova denúncia contra ele à Câmara dos Deputados, em função da ação que apura seu envolvimento no caso de negociação da portaria que permitiu concessões para empresas na administração dos portos em troca de pagamento de propinas, que tem como relator Luís Roberto Barroso.

O Palácio do Planalto convocou para uma reunião, em caráter de urgência, esta tarde, líderes da base aliada e ministros da área de articulação política. O objetivo oficial do encontro é discutir novas ações no Executivo Federal e articulações para a votação das matérias tidas como importantes pelo governo no Congresso. Mas o que se comenta na Câmara e no Senado é que, nas entrelinhas da conversa, está o resultado da última pesquisa Datafolha, que mostrou o presidente com reprovação de 70% dos brasileiros e o julgamento desta tarde da mais alta Corte do país.

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