NO SENADO

Metalúrgicos pedem explicações ao governo sobre possível venda da Embraer

Negociações, que acontecem em sigilo, foram tema de audiência pública, mas nenhuma autoridade do Executivo participou. Sindicalistas alertam para riscos ao patrimônio tecnológico e à soberania nacional

Jefferson Rudy/Agência Senado

Para vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, Herbert Claros, “o que está acontecendo é um crime”

Brasília – Sindicatos dos metalúrgicos de São José dos Campos, Botucatu e Araraquara, no interior paulista, denunciaram hoje (2), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, os riscos que correm trabalhadores do setor aeronáutico e o sistema de defesa do país caso seja confirmada a venda da Embraer para a Boeing. Para o vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, Herbert Claros, querer vender a empresa agora, por um valor próximo de US$ 6 bilhões, consiste em um risco para a sociedade e para o potencial tecnológico brasileiro.

Segundo dados apresentados por Herbert, nos últimos anos o governo fez investimentos da ordem de US$ 24 bilhões na Embraer por meio de iniciativas como desonerações na folha de pagamento e no recolhimento do INSS, entre outras. “O que sabemos é que esta negociação está sendo tratada secretamente. Tudo o que está acontecendo é um crime”, afirmou o metalúrgico.

O dirigente sindical disse ainda que sindicatos e demais entidades da sociedade civil estão procurando entrar em contato com câmaras municipais das cidades onde existem unidades da Embraer, assim como conversar com parlamentares do Congresso Nacional. O objetivo é pedir para que os ajudem a obter mais informações sobre a questão junto ao governo federal, dentro da campanha intitulada “A Embraer é Nossa”.

“A Embraer é uma empresa que tem 49 anos de existência. São 14 unidades, três fábricas no Brasil, uma quarta nos Estados Unidos e quinta fábrica localizada em Portugal. Está sendo oferecida a ‘preço de banana’ para agradar ao mercado, pois sabemos que a maior parte das ações da empresa está sendo negociada na Bolsa de Valores de Nova Iorque e os principais donos são acionistas estrangeiros. É a esse pessoal que o atual governo tenta agradar”, acrescentou o dirigente sindical.

De acordo com Herbert Claros, a previsão de especialistas do setor é de que os empregos existentes na estatal atualmente – caso essa venda seja concretizada – terão prazo de validade de no máximo 15 anos. Isto porque, para manter o atual nível, a empresa teria que apresentar um novo projeto para ser desenvolvido no Brasil neste período.

“É claro que não acreditamos que os americanos vão, numa empresa tão protecionista como a Boeing, preferir apresentar algum novo modelo de avião para ser feito pela Embraer. Vão querer aproveitar a tecnologia que temos aqui, mas as nossas unidades se transformarão em meras fabricantes de peças. Este é o cenário que prevemos”, ressaltou.

Soberania nacional

Herbert também destacou a questão da soberania nacional com a venda da estatal. Caso o que tem sido descoberto aos poucos pelos trabalhadores se confirme, a Boeing ficaria com 90% da fatia da nova companhia a ser criada, e a Embraer com apenas 10%, frisou.

“Estaremos desprotegidos em relação ao nosso sistema de defesa. Temos de ter o desafio de pensar no que é importante para o Brasil não apenas agora, mas para as próximas décadas”, acentuou.

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Botucatu, Fabrício Roque, lembrou a questão da responsabilidade social da empresa perante os trabalhadores das fábricas e das regiões que circundam o entorno das unidades da Embraer. “Queremos esclarecimentos, obter respostas sobre as dúvidas que temos e que o tema seja debatido como se deve pelos representantes do governo conosco e toda a sociedade”, disse.

Para Roque e outros sindicalistas, as negociações mantidas em sigilo trazem ainda mais preocupações. “Não falamos isso apenas por conta de incertezas sobre o futuro dos empregos. Falamos, também, por conta de toda a tecnologia aérea e militar acumulada pela empresa. Por isso esse debate é tão importante”, acrescentou a sindicalista e servidora da Embraer Marina de Arantes Leite.

Marina lembrou que a Embraer é a maior empresa em valor agregado do país, e a terceira maior empresa de aviões do mundo. “Por outro lado, apesar de tudo isso, sabemos que a Embraer é muito menor que a Boeing. E que, quando se fala em ‘fusão’, o que acontecerá será, na verdade, a incorporação da nossa estatal pela Boeing”, destacou.

Cobranças a Temer

Herbert Claros disse ainda que cabe a Michel Temer, barrar essa venda e dar uma declaração aos brasileiros sobre toda a negociação que está sendo realizada.

Foram convidados para a audiência, além do presidente da Embraer, Paulo Cesar de Souza e Silva, o representante do governo federal no Conselho Administrativo da empresa, brigadeiro José Magno Araújo, e representantes dos ministérios da Defesa e de Ciência e Tecnologia, mas nenhum deles compareceu ao encontro. Somente a Embraer justificou a ausência do seu presidente.

Diante disso, o presidente da Comissão de Direitos Humanos, senador Paulo Paim (PT-RS), solicitou aos presentes para se reunirem após o evento com assessores do Senado, para ser transcrita numa carta tudo o que foi discutido. O material será encaminhado oficialmente, em nome dos sindicalistas e dos senadores da comissão, ao presidente da Embraer e demais autoridades federais.

Estamos atentos e prontos para lutar contra estas ameaças ao nosso patrimônio, o que infelizmente temos visto constantemente desde que este governo ilegítimo assumiu. Vamos exigir amplo debate, aqui no Congresso e nos estados, sobre a questão, destacou Paim.

A audiência pública foi mais uma dentro do ciclo de debates sobre privatizações que tem sido realizado pela Comissão de Direitos Humanos do Senado.

 

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