Caravana no Sul

Lula: ‘Eu e o Haddad funcionávamos como Messi e Luiz Suárez’

Ex-presidente, em reunião com reitores em Santa Catarina, condenou agressões sofridas por integrantes da Caravana. 'A gente tem que se indignar enquanto é tempo'

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Lula em Florianópolis: “Precisamos aprender a ficar indignados. A sociedade ficou anestesiada desde 2013”

São Paulo Em encontro com reitores de universidades e institutos federais em Florianópolis, Santa Catarina, no fim da manhã deste sábado (24), o ex-presidente Lula falou sobre a situação da educação no Brasil, e reafirmou que esta será uma área prioritária em seu governo caso vença as eleições em 2018.

“O (Fernando) Haddad sabe, quando estivemos juntos, ele como  ministro e eu como presidente, que fizemos da educação uma prioridade do nosso governo. Com a crença de que não é possível ter um país desenvolvido, do ponto de vista social, científico e tecnológico, se não investir na educação”, disse. “De vez em quando conto uma coisa que muitas pessoas não gostam, mas quando São Paulo perdeu o golpe de 1932  que eles tratam como ‘revolução’, mas foi uma tentativa de golpe contra o governo federal , o que São Paulo fez? Ele tinha perdido a batalha militar mas ia ganhar a inteligência do país criando a USP. E criou justamente para evitar que o Estado federal pudesse adentrar São Paulo.”

Lula fez uma comparação histórica com países vizinhos para demonstrar o atraso brasileiro na área. “Se você pegar a história da América do Sul, todos os países, inclusive os que consideramos mais pobres como a Bolívia, o Paraguai e o Peru, todos tiveram universidades antes do Brasil. O Peru teve em 1550 a Universidade de São Marcos e o Brasil é foi ter uma universidade em 1920. E foi porque o rei da Bélgica vinha para cá e não poderia vir se não tivesse um título de honoris causa. A gente precisa contar essa história pra meninada para eles saberem o que era o país em 1920, 1930.”

Em sua fala, o ex-presidente fez uma comparação indireta entre o atual senador do Distrito Federal Cristovam Buarque (PPS) e o ex-ministro da Educação e ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad à frente da pasta. “Todo mundo sabe, e não vou contar, porque tirei o Cristovam (Buarque) do ministério, mas quando você governa faz menos discurso e faz mais coisa. Você não pode estar no governo fantasiando o futuro”, afirmou. “Eu e o Haddad funcionávamos como Messi e Luiz Suárez”, exemplificou, fazendo referência à dupla de jogadores do Barcelona.

“Eu falava: Haddad, temos que fazer tal coisa… Me inquietava profundamente o problema do financiamento da educação. Cheguei a pensar em usar o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, depois vi que era difícil por que tinha que pedir para o Conselho Curador do Fundo de Garantia, até que me aparecem duas propostas fantásticas. A primeira, do Prouni, tivemos um pouco de divergência, diziam ‘vocês vão fortalecer a iniciativa privada’, mas ninguém falava dos impostos que eles não pagavam. E conseguimos convencer a sociedade, apesar daqueles que diziam que o governo Lula ia nivelar a educação por baixo, colocando gente da periferia que não está preparada, que não fez uma escola qualificada. E o que aconteceu três anos depois? Em testes que foram feitos em 15 áreas os melhores estudantes eram os ‘despreparados’ do Prouni. Isso nos mostrou que as pessoas precisavam de uma oportunidade: me Dê uma oportunidade que nado o Oceano Atlântico, se não der, nem nadar vou conseguir”, argumentou.

“E a outra foi o Fies, o Haddad me apresentou a proposta. Nossa dívida ativa chega a 1,7 trilhão de reais, e não é de trabalhador, mas de gente mais graduada, e o governo perdoa. Fazer um Refis significa perdoar o caloteiro e desfavorecer quem pagou em dia”, apontou. “Qual foi a dificuldade do Fies? Era quem vai ser avalista de estudante, nem o pai quer. Falei pro Haddad, vamos fazer com que o Tesouro assuma a responsabilidade, se podemos avalizar tantos empresários que depois não pagam, por que não podemos avalizar o diploma de doutor de um jovem, uma jovem estudante desse país?”

Lula condenou ainda as atitudes agressivas e de intolerância das quais sua caravana foi alvo durante a passagem pelo sul do Brasil. “Precisamos aprender a ficar indignados. A sociedade brasileira ficou anestesiada desde aquela manifestação de 2013. A Copa do Mundo que era uma coisa boa para nós e foi transformada em ódio, a conquista de fazer as Olimpíadas, que foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida… Fui casado com a Marisa por 43 anos, nunca a vi chorar, e quando liguei para ela de Copenhagen ela estava chorando com a  beleza da apresentação do Brasil ali. E transformamos isso em ódio”, afirmou. “Nós fomos anestesiados e não fomos reagindo, fomos deixando acontecer. Os partidos de esquerda foram enfiando o rabo no meio das pernas, o movimento sindical foi refluindo, e eles foram crescendo. A ponto de hoje, virem fazer protesto, coisa que não conheço em 50 anos de política, de um partido comandado por um bando de fascistas para tentar evitar que alguém faça comício em uma praça.”

“A gente tem que se indignar enquanto é tempo. Sei o que causou de comoção no Brasil, em Santa Catarina, a morte do reitor da universidade federal (Luiz Carlos Cancellier). Sei que comoveu o Brasil. E daí? O que aconteceu depois que ele morreu?”, questionou.

Lá em Bagé, só queria visitar um laboratório de uma universidade que criamos em 27 de julho de 2005, que está com milhares de alunos e que tem 10 campi no Rio Grande do Sul. E sabe o que fizeram? Bloquearam a estrada para eu não entrar na universidade. Mais grave é que o Ministério Público, achando que é representante de Deus, através de um procurador federal de Bagé, mandou um ofício ao reitor dizendo que eu não podia visitar porque era uma atitude política”, descreveu. “Como pode um procurador da República não saber que nós brigamos muito pela autonomia das universidades e esse cidadão achar que estamos interferindo nisso? Aqui eles levaram um reitor ao suicídio. Lá em Bagé levaram o reitor a sair da cidade. Fui a Passo Fundo e lá o reitor é muito amigo nosso e na véspera ele recebeu um ofício ao Ministério Público dizendo que eu não ia podia ir à universidade. Entramos com um processo e ganhamos, o juiz disse que não era papel do Ministério Público dizer se eu podia ir ou não a uma universidade. Mas ali já estava criada a desgraceira e não conseguimos entrar em Passo Fundo. Mas sou tinhoso e vou voltar lá.”

Lula disse novamente que pretende federalizar o ensino médio no Brasil e também revogar a Lei do Teto, que impede a ampliação de investimentos em áreas como Educação e saúde. “Ou vamos ter que fazer um referendo revogatório ou convocar uma nova Assembleia Constituinte para mudar as coisas nesse país.”