entreguismo sem fim

Governistas tentam atropelar regimento para acelerar privatização da Eletrobras

Plano de trabalho apresentado hoje (20) na Câmara chocou vários deputados, que reclamaram da tentativa de excluir audiências públicas, seminários e visitas externas no processo de tramitação do projeto de lei

Alex Ferreira e Michel Jesus/Câmara dos Deputados

Erika Kokay e Aleluia: defesa da soberania do país e empenho em defender projeto contra interesse da população

Brasília – Ânimos exaltados, trocas de farpas e pedidos de exame sobre quebra regimental marcaram as quase três horas de debate na comissão especial que vai apreciar o Projeto de Lei (PL) 4963/18, sobre a privatização do Eletrobras. Depois de vários questionamentos, o presidente da comissão, Hugo Motta (PMDB-PB), pediu para o relator, José Carlos Aleluia (DEM-BA), ler só os títulos de cada capítulo do seu plano de trabalho, para que a discussão seja feita nesta quarta-feira (21). Como se não bastasse citar apenas eixos nos quais pretende esclarecer suas ações, Aleluia deixou de incluir a possibilidade de audiências públicas, seminários ou visitas externas às hidrelétricas. Ainda deixou de fora sugestões de entidades e especialistas do setor.

Dentre os eixos que o relator pretende abordar para o seu parecer estão, conforme ele afirmou, a questão da integração entre os órgãos do governo e ministérios que vão tocar a privatização (1), a situação da matriz do rio São Francisco propriamente (2) e a realização de uma pesquisa sobre o setor elétrico no país (3). Além da criação de uma sociedade mista para avaliar a privatização (4), elaboração de um pacto tarifário (5) e, por fim, a definição de um marco regulatório para o setor (6).

Integrantes da base aliada do governo fizeram de tudo para que o relatório fosse dado como lido, sem que a leitura tivesse sido realizada – procedimento regimental adotado em algumas ocasiões, diante do horário para início de sessão no plenário da Casa. Mas as tentativas não obtiveram sucesso. 

Na opinião de parlamentares como José Geraldo (PT-PA) e Erika Kokay (PT-DF), o conteúdo do relatório de Aleluia já era esperado, mas o que os deixou mais chocados foi a forma evidente de afastamento da participação popular da discussão.

“O relator excluiu, até mesmo, sugestões feitas durante audiências públicas que já foram realizadas nos estados sobre o tema e sobre como deveria ser montado esse plano de trabalho. Também foram realizadas audiências específicas sobre as condições do mercado livre de energia. É um absurdo que nada disso tenha sido levado em conta”, afirmou Erika.

“O primeiro expediente desse relator foi dizer que não queria fazer subrrelatorias para ajudar no seu trabalho e agora nos apresenta um plano desses. Para mim só há uma conclusão, a de que não se quer debate porque o relatório já está pronto e precificado, tanto pelo relator como pelo governo”, acusou a deputada.

Os parlamentares chamaram a posição da comissão especial, desde o início da reunião, de arbitrária, pelo fato de o presidente ter escolhido, sem espaço para discussão, José Carlos Aleluia como relator.

A deputada Luciana Santos (PCdoB-PE) chegou a questionar o fato de um evento a ser realizado no Tribunal de Contas da União (TCU) ter mencionado a participação de Aleluia como relator da matéria antes que eles próprios, integrantes da comissão, tivessem recebido o anúncio oficial sobre quem ficaria com a relatoria.

‘Bem que não se vende’

Também foi mencionada, várias vezes, a questão da entrega do setor elétrico do país ao capital estrangeiro. “Matriz energética é um bem que não se pode vender e todos sabem disso. Essa posição que o governo que aí está, que não tem voto, quer adotar, já foi vista por nós na época do governo Collor e do governo FHC (Fernando Henrique Cardoso)”, criticou o deputado José Geraldo (PT-PA).

“A privatização do setor elétrico só vai entregar algo nosso para os estrangeiros, encarecer o custo da energia para todos nós e levar o país a voltar a ser caloteiro como vocês todos são e sempre foram”, acrescentou Geraldo, ao lembrar as décadas em que o governo brasileiro não pôde pagar sua dívida externa e teve de decretar moratória junto ao Banco Mundial.

“Não nos chame de caloteiro. Exijo respeito”, gritou José Carlos Alelulia. “O senhor é da base de um governo que nem foi eleito para estar no lugar em que se encontra. Um governo que chegou onde está sem votos, por meio de um golpe”, disse Geraldo, numa discussão que só foi encerrada a pedido do presidente e de colegas.

Pouco antes de ser tratada a questão do relatório, muitos deputados pediram a leitura integral da ata da reunião anterior e contestaram o fato de Aleluia ter sido escolhido num momento em que o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), tinha solicitado o encerramento de todas as comissões técnicas para que os parlamentares se dirigissem para votação em plenário.

Mas após análise do regimento da Câmara, ficou definido que Aleluia pode, sim, ser o relator, porque a escolha é prerrogativa do presidente da comissão e já tinha sido tomada horas antes. “Pode até estar correta, mas esta é uma forma pouco democrática de atuar, como tem sido observado nos últimos anos, nesta Casa”, reclamou Luciana Santos.

Também não faltaram farpas ao presidente da comissão, que tentou protelar a apresentação do plano de trabalho e a leitura da ata e atuou para dar o documento como lido.

Hugo Motta, que está no seu primeiro mandato, chamou as tentativas de “argumentos protelatórios” e provocou sorrisos ao dizer “não confundam gentileza com gente lesa. Sou gentil, mas sei ser forte quando a ocasião exigir”.

O grupo se reúne, amanhã, a partir das 14h, no Plenário 1 para discutir, de fato, detalhes do plano de trabalho de José Carlos Aleluia.

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