Militarização

Rio como ‘laboratório’ mostra que Estado de exceção avança, diz Wadih Damous

O general do Exército Walter Souza Braga Netto afirmou, nesta terça, que Rio de Janeiro 'é um laboratório para o Brasil'. Para deputado do PT, declaração revela que intervenções podem se alastrar

Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Forças Armadas ganham mais poder e país aprofunda militarização da política e da economia, afirma deputado

São Paulo – A afirmação do general do Exército Walter Souza Braga Netto, interventor federal no estado, segundo o qual o Rio de Janeiro é hoje “um laboratório”, pode ser interpretada de duas maneiras que, aliás, não são excludentes. “Isso mostra como o estado do Rio de Janeiro é visto pelo governo. Tornou-se um estado de segunda classe a ponto de ser tratado como laboratório”, diz o deputado federal Wadih Damous, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio.

Para o parlamentar, a segunda leitura é ainda mais preocupante. “Ela mostra também o que estamos dizendo: que essa intervenção configura a consolidação do Estado de exceção. Ou seja, o que acontece no Rio provavelmente vai acontecer em outros estados”, avalia o deputado.

Em entrevista coletiva na manhã desta terça-feira (27), o general Braga Netto declarou que quando se “centraliza e unifica” o comando, a tendência é que o trabalho da inteligência fique mais ágil. Depois, acrescentou: “O que deverá ocorrer agora é uma maior agilidade. O Rio de Janeiro, ele é um laboratório para o Brasil. Se será difundido o que está sendo feito aqui para o Brasil, aí já não cabe a mim responder”.

Em sua opinião, o país aprofunda cada vez mais a “militarização da política, militarização da economia e empoderamento das Forças Armadas, particularmente do Exército”. Sinais disso, segundo ele, são a criação do Ministério da Segurança Pública e o Ministério da Defesa ser comandado agora por um militar, o general de Exército Joaquim Silva e Luna, fato inédito desde a criação da pasta, em 1999, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso.

“O que estamos assistindo é uma escalada autoritária, com Estado de exceção possivelmente como uma ditadura”, conjectura o ex-presidente da OAB-RJ.

Damous discorda dos que avaliam que a “escalada autoritária” é um exagero, e as cartadas de Temer com relação à segurança pública seriam apenas a tentativa do presidente de aumentar sua popularidade, com a provável intenção de se candidatar à presidência. Nesse caso, Temer estaria fazendo meras jogadas de marketing.

“Aos que estão dizendo isso, eu proporia que daqui a um mês fizessem uma pesquisa para ver se Temer cresceu 1% na popularidade. Ele pode até estar pensando nisso, mas essa militarização da política e da economia são características da dominação neoliberal em todo o mundo, hoje”, diz. “No Brasil, o Estado é frágil e foi praticamente dissolvido, e as Forças Armadas aparecem como sua face consolidada e repressiva. Então, a questão da popularidade de Temer é irrelevante.”

Nessa conjuntura, a possibilidade de a militarização se propagar pelo país é evidente, tanto em parte da classe média como em parcelas mais pobres da população. “Usar o argumento da segurança pública sempre sensibiliza contingentes da classe média. Pode ganhar o país, com apoio de parte da população. E a população oprimida pelo tráfico, pela polícia e pelas milícias vê nos Exército às vezes uma força libertadora.”

Na opinião de Wadih Damous, a reversão dessa militarização em curso, pelo processo que vai desencadear nas eleições de 2018, vai depender da legitimidade do pleito. “Tenho minhas dúvidas sobre a legitimidade dessas eleições e como elas vão acontecer. Está com cara de eleição tutelada. No Rio de Janeiro, qual liberdade eleitoral vai existir com o estado sob intervenção? Lula vai concorrer? Então não sei se o processo eleitoral vai reverter isso.”

Lula

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) agendou para a próxima quinta-feira (1) o julgamento do habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pelo qual tenta evitar que ele seja preso depois que todos os recursos forem esgotados no Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Pedido de habeas corpus já foi negado em caráter liminar pelo vice-presidente do STJ, ministro Humberto Martins.

Já o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin preferiu enviar ao plenário pedido feito pela defesa do ex-presidente. A decisão de pautar ou não os julgamentos depende da ministra Cármen Lúcia, presidenta da corte.

Nas últimas semanas, tem aumentado a pressão para Cármen colocar na pauta de julgamento as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44, que o ministro Marco Aurélio Mello liberou para julgamento no dia 7 de dezembro, e que versam sobre o tema.

O ex-ministro do STF Nelson Jobim defendeu hoje (27) que a prisão de condenados em segunda instância só seja executada depois de decisão definitiva no STJ.