Improbidade X Abusividade

‘Defesa de Temer é grosseria ímpar, mas provocada pelos abusos do MP’, diz Aragão

Para ex-ministro, argumentos de Temer contra Janot podem ser considerados 'falta de decoro'. Mas abusos da PGR dificultam entendimento do que está em jogo e atrapalham verdadeiro combate à corrupção

José Cruz/ABR

Tanto a conduta de Temer como a de Janot contribuem para despolitização da sociedade

Brasília – O procurador da República, acadêmico e ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão critica duramente os argumentos apresentados pelo presidente Michel Temer na peça de defesa apresentada pelos seus advogados à Câmara dos Deputados, na semana que passou. Mas pondera que as ofensas feitas por Temer a Janot foram motivadas “pelos próprios abusos do Ministério Público nos últimos anos”. Na avaliação de Aragão, quem perde com isso é a população, que “tende a não saber quem é quem”.

Para Aragão, o objetivo de Temer, com os argumentos apresentados, foi se colocar em posição semelhante à do PT, dizendo que é tão vítima quanto os petistas. “Para se vitimizar, saiu-se com o discurso patético de que também é vítima de golpe”, diz. 

O ex-ministro considerou a peça da defesa com as críticas a Rodrigo Janot de uma grosseria poucas vezes vista por parte de uma autoridade e um caso que poderia até ser avaliado como de falta de decoro por um presidente da República no uso do cargo.

Eugênio Aragão disse que, por outro lado, as “lambanças do Ministério Público nesse caminho de perseguição e vingança foram fatores que levaram a isso tudo”. Foi o que faz, segundo o ex-ministro, com que todos os casos fossem colocados “num mesmo saco” e que os abusos do MP servissem para que Temer pudesse vir a usar esse tipo de estratégia. 

Para Aragão, os critérios precisam valer para todos, e quem critica vazamento seletivo de informações e a perseguição a políticos do PT também tem que criticar quando o mesmo se dá com Temer. “A questão principal é que sabemos que os dois são diferentes e essa prática que foi utilizada pelo MP, e levou a isso, fragiliza o combate a toda a corrupção. É vento na vela dos que dizem que todos os políticos são podres”, observa – classificando como “lamentável” a situação institucional. 

“Lamentável essa colocação do Temer e lamentável o fato de a Procuradoria-Geral da República ter atuado nos últimos anos com esse tipo de discurso, que só prejudicou o país. Hoje, ninguém sabe quem é quem”, ressaltou.

Baseado em delações

A defesa do presidente, entregue na Câmara pelo seu advogado, Eduardo Carnelós, diz que a denúncia apresentada pelo ex-PGR Rodrigo Janot contra ele é “armada”, baseada em “provas forjadas” e tem o objetivo claro e “indisfarçável” de depor Temer. “Constitui-se, portanto, em tentativa de golpe”, afirma o advogado.

Faltando poucos dias para deixar o cargo, Janot denunciou Temer e os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e Moreira Franco, da Secretaria-geral da Presidência, por organização criminosa e obstrução de justiça. A defesa do presidente ainda acusa o ex-procurador-geral da República de “sem provas, ter atuado para conseguir que os delatores dissessem aquilo que lhe interessava que pudessem incriminar o presidente”.

A defesa do ministro Eliseu Padilha seguiu argumento semelhante à do advogado de Temer e destacou, de forma mais lacônica, que Padilha é apontado como o político atrás do codinome “primo”, nas planilhas da construtora Odebrecht, “apenas quando convém aos interesses dos procuradores”.

O advogado Antonio Pitombo, que atua para o ministro Moreira Franco, disse que vai também contestar “o comportamento e a moralidade do ex-PGR.  “É importante o controle da Casa sobre o que foi feito na Procuradoria-Geral. Esta defesa põe em dúvida a legalidade do comportamento do PGR e a moralidade desse comportamento, desde a investigação”, afirmou.

A Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara vai juntar as peças e propor um parecer sobre a matéria antes de esta seguir para o plenário. Mas ainda enfrenta dificuldades para acertar os ponteiros entre o colegiado sobre temas como o relator designado, o rito de tramitação da denúncia – se esta será ou não fatiada, como pediu a oposição – e as articulações para troca de cadeiras entre integrantes do colegiado pelas lideranças dos partidos.

Relator permanece

Ontem, depois de várias reuniões, o PSDB tirou o deputado Bonifácio de Andrada (MG) do colegiado da comissão. Foi uma forma de impedir que Andrada continuasse na relatoria do caso, diante da intenção dos tucanos, de liberar a bancada para votar da forma como bem entender. A estratégia, porém, não deu certo.

Uma manobra regimental permitiu que Andrade continuasse sendo integrante da comissão com a concessão de uma vaga do PSC para ele, em substituição ao deputado Marco Feliciano (PSC-SP). Sendo assim, o parlamentar continuará a relatar a denúncia.

A oposição também se mexe no sentido de organizar um relatório paralelo, que deverá ser apresentado, inicialmente, pelo deputado Sergio Zveiter (Podemos-RJ), pelo acolhimento da denúncia, que será um contraponto ao texto de Bonifácio de Andrada, que já se antecipou ao criticar a denúncia e dizer que dará parecer pela sua rejeição.

 

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