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Sem alarde, Temer quer mudar composição e funções do Comitê Gestor da Internet

Governo publicou consulta pública para alterar o funcionamento do órgão responsável pelas normas e uso da internet no Brasil. Mudanças visam a atender interesses do setor privado

EBC

Coalizão Direitos na Rede afirma que força da sociedade civil no Comitê incomoda operadoras de telecomunicações

São Paulo – O governo de Michel Temer publicou na última terça-feira (8), no Diário Oficial da União, consulta pública com o objetivo de alterar a composição, o processo de eleição e as atribuições do Comitê Gestor da Internet (CGI.br). Criado em 1995, o CGI.br é responsável por estabelecer as normas e procedimentos para o uso e desenvolvimento da internet no Brasil, sendo desde então composto por representantes do governo federal, do setor privado, da sociedade civil e por especialistas técnicos e acadêmicos. Ao longo do tempo, o CGI.br tornou-se referência internacional de governança multissetorial da internet, com seu papel ainda mais fortalecido após a promulgação do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) e de seu decreto regulamentador, que estabelece que cabe ao órgão definir as diretrizes para todos os temas relacionados ao setor.

Segundo a Coalizão Direitos na Rede, um coletivo independente de organizações da sociedade civil, ativistas e acadêmicos em defesa da internet livre e aberta no Brasil, foi a partir da regulamentação do Marco Civil da Internet que o CGI.br passou a ser alvo de disputas e grande interesse do setor privado.

O grupo publicou uma nota de repúdio contra a decisão do governo de publicar, de modo unilateral, uma consulta que visa alterar o modelo do Comitê Gestor, sem qualquer contato prévio com os próprios integrantes do CGI.br.

“A consulta não foi pauta da última reunião do CGI.br, realizada em maio, e nesta segunda-feira, véspera da publicação no DOU, o coordenador do Comitê, Maximiliano Martinhão, apenas enviou um e-mail à lista dos conselheiros relatando que o Governo Federal pretendia debater a questão – sem, no entanto, informar que tudo já estava pronto, em vias de publicação oficial. Vale registrar que, no próximo dia 18 de agosto, ocorre a primeira reunião da nova gestão do CGI.br, e o governo poderia ter aguardado para pautar o tema de forma democrática com os conselheiros/as. Porém, preferiu agir de forma autocrática”, diz trecho da nota publicada pela Coalizão Direitos na Rede.

O coletivo afirma que, desde sua posse à frente do CGI.br, em 2016, Maximiliano Martinhão – que também acumula o cargo de Secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – tem defendido mudança no Comitê Gestor da Internet, alegando receber “demandas de pequenos provedores, de provedores de conteúdos e de investidores” para alterar a composição do órgão.

“A pressão para rever a força da sociedade civil no Comitê cresceu, principalmente por parte das operadoras de telecomunicações, apoiadoras do governo. Em dezembro, durante o Fórum de Governança da Internet no México, organizado pelas Nações Unidas, um conjunto de entidades da sociedade civil de mais de 20 países manifestou preocupação e denunciou as tentativas de enfraquecimento do CGI.br por parte da gestão Temer. No primeiro semestre de 2017, o Governo manobrou para impor uma paralisação de atividades em nome de uma questionável ‘economia de recursos’”, afirma a nota.

Martinhão e outros integrantes do governo Temer têm defendido publicamente mudanças em conquistas obtidas no Marco Civil da Internet, como a flexibilização da neutralidade da rede e a necessidade do usuário autorizar o uso de seus dados pessoais. Para a Coalizão Direitos na Rede, “mudar o CGI é estratégico para os setores que querem alterar os rumos das políticas de internet até então em curso no país”.

“É repudiável que um processo diretamente relacionado à governança da Internet seja travestido de consulta pública sem que as linhas orientadoras para sua revisão tenham sido debatidas antes, internamente, pelo próprio CGI.br. É mais um exemplo do modus operandi da gestão que ocupa o Palácio do Planalto e que tem pouco apreço por processos democráticos”, afirma a nota, que exige o cancelamento da consulta.

 

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