NA CÂMARA

Denúncia contra Temer divide deputados. Governistas criticam Rodrigo Maia

Ambiente fica carregado com especulações sobre possíveis delações de Cunha e Funaro. Base do governo conta com acordos para virar o jogo, enquanto oposição pede presença de Janot na CCJ

Cleia Viana/Câmara dos Deputados

“Vamos insistir na votação dos requerimentos para ouvir Janot”, reiterou Maria do Rosário

Brasília – A Câmara dos Deputados discute, nesta quinta-feira (6), três polêmicas envolvendo a crise política do país. De um lado, os deputados da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Casa (CCJ) se dividem na discussão sobre se o parecer a respeito da denúncia contra o presidente Michel Temer precisará ter foco no mérito ou na admissibilidade da questão. De outro, parlamentares de vários partidos demonstram tensão com o teor explosivo da delação premiada que estaria sendo acertada, de forma conjunta, entre o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o doleiro Lúcio Funaro. Para completar, não param de ser feitas, de todas as partes, críticas e insinuações de que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) estaria muito afastado do governo.

Primeiro na linha de sucessão à presidência da República, Maia tem sido aconselhado a tomar uma postura institucional e ficar o mais distante possível das conversas sobre a denúncia contra o presidente por corrupção passiva, feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele tem dito que o objetivo é evitar ser acusado de traidor a Temer ou facilitador de uma possível rejeição à abertura do processo. Mas sua postura tem desagradado o Palácio do Planalto e representantes da base de sustentação ao governo.

Entre oposicionistas, tem sido comum a crítica em forma de ironia no sentido de que o deputado “está fazendo com Temer o mesmo que ele (Temer) fez com Dilma Rousseff”. Na noite de ontem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva colocou ainda mais lenha na fogueira, ao declarar que “golpista é golpista”, dando a entender que será pequena a mudança de Temer para Maia, caso Maia venha mesmo a suceder o presidente.

O ponto nevrálgico da insatisfação dos deputados ligados ao governo com Rodrigo Maia se deu na última segunda-feira, quando o presidente da Câmara se recusou a receber o deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), escolhido relator da matéria, para uma conversa. “Prefiro ficar o mais distanciado possível para não ser acusado de nada”, teria dito aos colegas, que chegaram a reclamar diretamente com o Palácio do Planalto, segundo informações de bastidores.

Mérito ou admissibilidade

Na CCJ, a discussão sobre o mérito ou a admissibilidade da denúncia tem como pano de fundo uma possível convocação de Rodrigo Janot para falar na comissão. A sugestão foi feita pelo próprio relator, que considera que, se o procurador-geral não for chamado a falar, posteriormente, qualquer decisão dos parlamentares sobre acolhimento ou rejeição da denúncia pode vir a ser alvo de anulação.

O presidente da Comissão, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), encaminhou o caso para avaliação do departamento jurídico, diante do tamanho da divergência entre os 66 integrantes da CCJ sobre a questão. Pacheco comunga da mesma ideia dos integrantes da base aliada de que, se a competência da Casa para com a denúncia é só uma questão de admissibilidade, não há motivos para se ouvir o procurador-geral.

Mas muitos deputados insistem que é importante prestar atenção nessa questão do mérito, mesmo com a certeza de que quem fará o julgamento sobre se a denúncia será ou não aceita ao final é o Supremo Tribunal Federal (STF).

“O procurador-geral da República é o autor da denúncia. Em tese, seele não for comunicado do julgamento e também não lhe for facultado o direito de se manifestar, pode, sim, amanhã ser alegada uma nulidade por não ter sido observado o princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa”, afirmou Sergio Zveiter, relator da matéria na CCJ.

Por parte da oposição, coube ao deputado Paulo Teixeira (PT-SP) e à deputada Maria do Rosário (PT-RS) reclamarem da ausência de participação da procuradoria-geral no rito da CCJ. “Este não pode ser um processo sem equilíbrio entre defesa e acusação, sem paridade de armas. Tem que ser dado espaço para a defesa (de Temer), e, da mesma forma, para a acusação”, afirmou Teixeira.

“Por isso o PT propõe que se ouça o procurador-geral, representando a acusação, para garantir o contraditório e evitar um rito sumário na análise da denúncia contra Temer”, acrescentou o parlamentar. “Vamos insistir na votação dos requerimentos para ouvir Janot e outros envolvidos no escândalo contra o presidente”, reiterou Maria do Rosário.

Expectativas de resultado

Entre os integrantes da base aliada, o ambiente é de expectativa, com uma tendência favorável para o presidente na votação de plenário sobre a denúncia, depois dos contatos feitos entre o próprio Temer e ministros com parlamentares em busca de apoio, nos últimos dias. Mas entre os oposicionistas também são fortes as comemorações pela existência de um racha maior observado em legendas aliadas do governo, como o PSDB, o PPS e o próprio PMDB.

O deputado e ex-governador de Pernambuco Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) foi um dos parlamentares a chamar a atenção. Ele declarou que, após pensar, decidiu votar pelo acolhimento da denúncia. “Pensei bastante e até poucos dias atrás estava aguardando um esclarecimento por parte do presidente para me posicionar. Agora não dá mais para aguardar, o esclarecimento não veio. O que temos é uma denúncia muito grave e quem me conhece sabe que sempre fui a favor que qualquer denúncia desta dimensão seja investigada pela Justiça”, disse.

Jarbas Vasconcelos é considerado o “peemedebista mais tucano” do Congresso, pela ligação que sempre teve com políticos da legenda. A avaliação de vários colegas foi de que suas declarações foram um aceno de que o PSDB pode desembarcar do governo a qualquer momento.

Ontem, durante ato realizado pelo PT em Brasília para marcar a posse da nova direção da sigla, que contou com a participação de políticos de várias legendas da esquerda, a ex-presidenta Dilma Rousseff fez elogios a outro peemedebista, o senador Roberto Requião (PMDB-PR), que foi contrário ao impeachment no ano passado e se mantém contra o governo, mesmo sendo do PMDB. Dilma disse que jamais se esquecerá das três palavras de início do discurso de Requião no dia da votação do seu afastamento, no plenário Ulysses Guimarães: “Vergonha, vergonha, vergonha”.

Em reservado, nos corredores do Congresso como um todo (Câmara e Senado), tanto oposicionistas como governistas deram como certos, nesta quinta-feira, 28 votos pela rejeição da denúncia na comissão. Ontem, a base aliada falava em 30 votos. São necessários, para que a matéria seja rejeitada por sistema de maioria simples no colegiado, 34 votos no total.

Conforme o regimento interno da Câmara, independentemente do resultado a ser observado na CCJ, o tema vai a votação em plenário. Mas todos concordam que a votação na comissão será um grande termômetro para mudar votos e definir tendências entre as bancadas sobre como se posicionarem.