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Redes sociais mostram repúdio à PF por condução coercitiva no BNDES

Depois que 37 funcionários do banco foram abordados de forma truculenta para prestar depoimento, internautas e instituições como a OAB manifestam-se contra prática que é marca dos regimes de exceção

abr

A presidente do banco divulgou nota: plena confiança nos funcionários do BNDES, mas sem condenar a ação da PF

Rio de Janeiro “Poderia ter sido eu”. O bordão adotado nas redes sociais por funcionários do BNDES nestes últimos dias expressa a crescente onda de espanto e repúdio à ação da Polícia Federal, que na sexta-feira (12) resultou na condução coercitiva de 37 pessoas do banco estatal para prestar depoimento. A ação da PF fez parte da Operação Bullish que, por iniciativa do Ministério Público Federal (MPF), investiga supostas irregularidades cometidas pela BNDESPar – subsidiária do banco dedicada a investimentos – na concessão de apoio financeiro ao Grupo JBS entre 2007 e 2011.

Autorizados pelo juiz Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Seção Judiciária do Distrito Federal, que atendeu a um pedido do MPF, policiais buscaram funcionários da ativa e aposentados do BNDES em suas casas, incluindo idosos e uma mulher grávida com 40 semanas de gestação. O método, considerado desnecessário e truculento, lembrou os piores momentos da Operação Lava Jato e mereceu crítica contundente também da seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ).

Ontem (16) foi divulgada uma nota de repúdio aos métodos da Operação Bullish, assinada pela OAB e pela Associação de Funcionários do BNDES (AFBNDES), além de juristas e advogados. O documento afirma não questionar “a investigação de fatos que, em primeira análise, possam parecer irregulares”, mas ressalta que “a investigação deve respeitar os limites legais e constitucionais estabelecidos, sem se valer de métodos que violem as garantias fundamentais”. Os signatários consideram as conduções coercitivas “desnecessárias e desproporcionais, em desrespeito aos direitos fundamentais dos conduzidos, caracterizando-se como conduta abusiva por parte do Estado”.

Após lembrar que a condução coercitiva é um instrumento de exceção e que pode ser utilizado somente no caso de testemunhas não atenderem à intimação para interrogatório, a nota afirma que a ação da PF “foi direcionada a pessoas que não foram intimadas previamente a prestar esclarecimentos ao órgão policial” e que “não se pode admitir o emprego de métodos constrangedores e violentos”. Além disso, observa o documento, todas as 37 pessoas conduzidas à força pelos policias tinham domicílios e/ou empregos fixos e conhecidos.

A nota cita ainda “a semente potencial de um estado policialesco em que pessoas são arrancadas de suas casas sem motivo nem fundamento e conduzidas para prestarem depoimentos que poderiam ser prestados de forma não traumática nem violenta, dentro dos ditames da legislação e sem nenhum prejuízo à rapidez ou eficiência das investigações”. Os signatários ressaltam que “um cenário semelhante já foi vivenciado em outros tempos pela sociedade brasileira e há muito superado pelo processo de democratização do país” e afirmam que “não podemos e não queremos retroceder a tempos sombrios da história recente brasileira, dominada pelo autoritarismo e pela violência”.

Timidez

Nomeada pelo governo de Michel Temer após o impeachment de Dilma Rousseff, a atual diretoria do BNDES procurou em um primeiro momento tratar o caso como “problema da gestão anterior”. A presidente do banco, Maria Silvia Bastos Marques, divulgou uma nota na qual apenas afirma “ter plena confiança nos funcionários do BNDES”, sem condenar a ação da PF e do MPF na Operação Bullish. A postura foi considerada tímida pelos funcionários, que realizaram na segunda-feira (15) em frente à sede do banco no Rio de Janeiro uma nova manifestação de repúdio à condução coercitiva dos colegas de trabalho, que incluiu uma vigília simbólica de uma hora em defesa da instituição.

A AFBNDES enviou uma carta aberta à diretoria do banco, na qual os funcionários cobram “a necessidade de uma posição firme, decidida e contundente da presidente do BNDES, da diretoria e do Conselho de Administração pela correção dos procedimentos de investigação e em defesa dos funcionários da instituição”. A carta exige também que a diretoria atue para “que haja o esclarecimento e a correção das informações equivocadas sobre a atuação do BNDES que circulam na imprensa e na mídia, repetidas à exaustão até se tornarem verdades para a população”. Para isso, os funcionários sugerem que a diretoria do BNDES tome a iniciativa de pedir a abertura do sigilo das operações que envolvem o Grupo JBS e realize seminários abertos à sociedade civil e à população em geral para esclarecer o caso e todas as operações realizadas pelo banco.

Mesmo saco

Com 37 funcionários ou ex-funcionários do BNDES atingidos pela ação da PF, a condução coercitiva realizada na manhã de sexta-feira foi assunto em todos os departamentos do banco. Os relatos sobre a truculência dos policiais rapidamente ganharam os corredores: “Quase todo mundo tem um conhecido ou colega de setor que foi conduzido. Estão dizendo que os policiais forçaram portas de residências e tiraram pessoas da cama, quase mataram de susto, teve gente que pensou que era assalto”, diz J.B., funcionário do BNDES há 20 anos, que prefere não ser identificado.

Nas redes sociais, funcionários do BNDES trocaram relatos e mensagens de repúdio à ação da PF e solidariedade aos colegas conduzidos para depor: “Desde as primeiras investigações, não há qualquer evidência de enriquecimento ilícito desses funcionários. Apesar disso, foram colocados pela imprensa e pelos investigadores no mesmo saco daqueles que vêm pilhando o país inescrupulosamente. Poderia ter sido eu”, postou R.B., usando a expressão que depois foi várias vezes repetida pelos colegas de trabalho.

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