CRISE AMPLIADA

Michel Temer falha em tentativa de reunir aliados para evitar desembarque

Intenção do governo era fortalecer laços com PSDB e DEM e evitar obstrução total dos trabalhos do Congresso a partir desta segunda-feira; mas poucos atenderam aos apelos do presidente

Reprodução/Twitter

O isolamento começou a ser percebido desde o dia seguinte à divulgação das gravações

Brasília – Um clima de confusão no qual ninguém se entende e as decisões e convites mudando a todo momento. Este é o ambiente observado em Brasília desde a noite da última quarta-feira (17), quando foi divulgado o conteúdo das gravações entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, da JBS, e que vem dando sinais de piora a cada momento. A novidade é o cancelamento do jantar que havia sido programado hoje (21) com ministros, parlamentares e líderes partidários que dão sustentação ao governo.

Ministros da equipe de articulação política se dedicaram a ligar para deputados e senadores para pedir que antecipassem seus retornos a Brasília a tempo de participar do encontro. Nas últimas horas, porém, o governo cancelou o jantar sem dar muitas explicações.

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, minimizou o quadro dizendo que a questão foi de incompatibilidade de agendas. Mas em reservado, assessores do Planalto afirmaram que o cancelamento se deu depois da constatação de que um número muito pequeno de parlamentares tinha confirmado participação.

O isolamento do presidente dos representantes do Congresso Nacional começou a ser percebido desde a manhã da quinta-feira (18), dia seguinte à divulgação das gravações. A estratégia do Palácio do Planalto nas últimas horas, vinha sendo tentar segurar, sobretudo, parlamentares do PSDB e do DEM, que ficaram de se reunir nos próximos dias para decidir se continuam aliados de Michel Temer. De acordo com integrantes do Planalto, se o PSDB continuar fazendo parte da base, será possível manter o apoio de outras legendas.

Por isso, como forma de protelar essa avaliação por parte de tucanos e democratas, foi combinado o jantar, marcado com o pedido aos presidentes das duas legendas para que desmarcassem a reunião que tinham combinado de realizar hoje e, assim, evitar precipitações.

Tucanos e democratas já tinham acertado que, se decidirem sair do governo, vão atuar conjuntamente. E, dessa forma, aceitaram o adiamento. Mas parlamentares das duas siglas têm demonstrado, nos bastidores, que estão divididos sobre como devem agir nos próximos dias.

Já declararam estar fora da base aliada o PSB (em reunião da executiva nacional realizada ontem), o PPS e o Podemos (ex-PTN). Só que no caso do PSB e do PPS, dois ministros confirmaram que continuarão integrando a equipe de Temer, mesmo assim. São eles o ministro da Defesa, Raul Jungmann (PPS-PE) e de Minas e Energia, Fernando Bezerra Filho (PSB-PE).

Jungmann argumentou que fica em função da importância estratégica da sua pasta, no momento crítico vivido pelo país. E Bezerra Filho disse aos colegas de partido que sua nomeação não foi uma vaga conquistada pelo PSB, mas consistiu em critérios pessoais que levaram à escolha pelo seu nome – motivo pelo qual permanecerá no ministério.

Debate sobre reformas

Desde o início do dia, Temer esteve reunido com ministros mais próximos, assessores da área de comunicação e advogados. O que mais se falou até o final da tarde foi que a  equipe também tentou estava atuar junto aos parlamentares, por meio de conversas e telefonemas, em formas de evitar uma obstrução das votações previstas para serem realizadas a partir desta segunda-feira (22), na Câmara e no Senado (que envolvem, sobretudo, a votação da reforma da Previdência e o andamento da reforma trabalhista). Mas avaliou que não há a mínima condição de conseguir reverter o quadro de obstrução.  

“É uma preocupação diferente que se tem a cada dia, desde quarta-feira. O pronunciamento do presidente ontem deixou muitos integrantes da equipe animados, mas essa animação mudou depois do parecer do procurador-geral da República. Hoje o dia é de tentativa de fazer alguma costura com os partidos”, contou um peemedebista que participou de uma das reuniões.

O parecer ao qual ele se refere é do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para quem o Supremo Tribunal Federal (STF) não deve suspender o inquérito aberto contra Temer. A avaliação de Janot é de a realização de perícia nas gravações das conversas entre o presidente e o empresário podem ser realizadas em paralelo, sem qualquer prejuízo nem para o presidente nem para a correição das apurações por parte do Judiciário.

Entre os parlamentares, a situação também é dúbia em relação à votação das reformas. O senador Cristóvam Buarque (PPS-DF), que disse que “a fala de Temer, ontem, não o isenta das dúvidas que a população precisa esclarecer”, destacou considerar necessa´rio “separar as coisas” e afirmou que quer a continuidade da votação das reformas. O relator da reforma trabalhista no Senado, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), por outro lado, que é apoiador de Michel Temer desde a primeira hora, descartou totalmente esta possibilidade.

De acordo com Ferraço, “o Congresso não tem como dar andamento a matérias de tamanha importância diante desta crise”. Para os oposicionistas, o fato já está consumado: a semana vai ser de pressão pelo acolhimento de um dos oito pedidos de impeachment protocolados até a última sexta-feira ou do nono, que vai ser formalizado amanhã, pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Nada mais será tratado em termos de trabalhos do Legislativo.

“O momento é de irmos para as ruas e fazermos nossa parte no Congresso. Reformas agora, nem pensar”, disse o líder da oposição na Câmara, José Guimarães (PT-CE).