Marcio Pochmann

Crise política: atores, novo acordo ou barbárie

O tempo urge na mesma medida em que avança o descrédito das instituições e das principais personalidades nacionais

Agência Câmara

Com a perda contínua da credibilidade, o isolamento do governo Temer torna-se cada vez maior, aumentando o risco da promoção de um segundo golpe político ampliador da barbárie

O acordo político constituído para tornar possível a transição da ditadura militar em 1985 e que terminou sendo responsável pela sustentação, desde então, dos governos democráticos ao longo do ciclo eleitoral da Nova República, foi desfeito em 2016. Com isso, os sinais de anormalidade democrática foram se generalizando e indicando que a sua superação dificilmente transcorrerá institucionalmente no formato tradicional.

Outro acordo político se tornou necessário. Atualmente, contudo, não mais vigoram as forças políticas que protagonizaram o entendimento no país do início da década de 1980, compostas por significativa burguesia nacional e amplas classes média assalariada e trabalhadora industrial.

Por outro lado, as forças sociais que se tornaram vanguarda dos acontecimentos de retirada do governo Dilma em 2016 seguem apostando na polarização politica que divide o país e torna insustentável a estabilidade nacional. Com a perda contínua da credibilidade, o isolamento do governo Temer torna-se cada vez maior, aumentando o risco da promoção de um segundo golpe político ampliador da barbárie.

Neste impasse, a decadência segue pelo caminho da irrelevância internacional e surgem inúmeros escândalos de grande dimensão, numa espécie de rosário de vergonhas nacionais. Por isso, a alternativa de outro acordo político que possa fazer o país transitar da tática financista do curtíssimo prazo para a estratégia de um projeto de nação.

Nesse sentido, o aprofundamento da radicalidade democrática. Alargar a voz dos descontentes de todos os matizes culturais para ouvir e, assim, buscar a construção da convergência necessária para a formação de uma nova maioria dirigente nacional.

O método da Constituinte exclusiva e de curto prazo para a reforma do sistema político poderia contemplar o centro da agenda de um novo acordo nacional. A base deste entendimento fundamental para o encaminhamento da saída institucional não tradicional ao que se têm hoje poderia contar, por exemplo, com quatro pontos de estratégia nacional de abandono do quadro regressivo que contamina tanto a economia como a sociedade brasileira.

Assim, os pontos da soberania nacional, da infraestrutura, do desenvolvimento e da inclusão social se mostram centrais a qualquer acordo que vise superar o aprisionamento nacional à lógica do curto prazo. Na temática soberania, sobressaem o sistema de defesa nacional, a integração regional e a matriz energética.

Na infraestrutura, os eixos de integração interna pelo sistema de transportes (portos, aeroportos, ferrovias, rodovias) e de comunicações e informações se aliam à sustentação de condições de vida decentes para todas as cidades e, principalmente, nas aglomerações metropolitanas. Na mesma medida, o tema do desenvolvimento se desenlaça pela exigência da reindustrialização e a expansão do sistema produtivo em novas bases sustentáveis ambientalmente, ancorada na eficiência tributária e parceira da competição externa e atendimento das exigências de atendimento do mercado interno.

Por fim, e não menos importante, a inclusão social assentada na reforma do Estado que enfrente os monopólios sociais a segmentos privilegiados da população, seja na arrecadação, seja no gasto público. Também passa pelo tema da sociedade que se deseja constituir, a redefinição dos investimentos do Estado, sem os quais as condições de inclusão social não superarão os limites dos valores e percepção de todos os estratos sociais, sobretudo a população na base da pirâmide social.

O tempo urge na mesma medida em que avança o descrédito das instituições e das principais personalidades nacionais. Mas quem poderá assumir a posição de protagonizar o novo acordo antes que a barbárie ponha fim ao regime democrático nacional?

Professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas.

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