'Governo repressor'

Raduan Nassar recebe Prêmio Camões e protesta contra governo. Ministro critica

Um dos maiores escritores da língua portuguesa disse, durante sua homenagem, que o Brasil vive 'tempos sombrios'. Já Roberto Freire, que assumiu o microfone para defender governo, recebeu vaias

reprodução/agpt/ebc

‘Os fatos configuram um governo repressor’, disse Raduan (esq.); Freire (dir.) saiu em defesa de Temer

São Paulo – Raduan Nassar, autor de Lavoura Arcaica e considerado um dos maiores escritores vivos da língua portuguesa, ao receber na manhã de hoje (17) o Prêmio Luís de Camões fez um discurso crítico ao momento do país: “Vivemos tempos sombrios, muito sombrios”, disse em referência ao governo de Michel Temer (PMDB). O ministro da Cultura, Roberto Freire, reagiu, criticando e discutindo com parte da plateia durante a entrega de um dos maiores prêmios literários da língua portuguesa.

“Invasão na sede do Partido dos Trabalhadores; invasão na Escola Nacional Florestan Fernandes; invasão nas escolas de ensino médio; prisão de Guilherme Boulos, membro da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto; violência contra a oposição democrática ao se manifestar na rua. Episódios perpetrados por Alexandre de Moraes”, disse Raduan sobre o ex-secretário de Segurança Pública de São Paulo, durante governo de Geraldo Alckmin (PSDB), e ministro licenciado da Justiça, indicado pelo presidente para ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF).

O escritor seguiu contundente em seu discurso. “Os fatos configuram por extensão todo um governo repressor: contra o trabalhador, contra aposentadorias criteriosas, contra universidades federais e ensino gratuito, contra a diplomacia ativa e altiva de Celso Amorim (ex-ministro das Relações Exteriores, presente ao evento). Governo atrelado por sinal ao neoliberalismo com sua escandalosa concentração da riqueza, o que vem desgraçando os pobres do mundo inteiro”, afirmou.

Irritado, Freire disse que integra um governo democrático. O ministro, contrariando o protocolo, discursou por último, quando o habitual seria deixar a palavra final para o homenageado. “Não existe nenhuma confusão em relação ao momento democrático que vive o Brasil”, disse Freire, seguido de risos e vaias da plateia. “É um humorista!”, afirma um presente.

“Esse prêmio está dando não apenas o reconhecimento, mas prêmio concreto. Para que saibam disso, dado pelo governo democrático brasileiro. E não foi rejeitado”, disse Freire indicando que Raduan deveria ter rejeitado a premiação, que existe desde 1988, por iniciativa conjunta de Brasil e Portugal. “O governo atual permite momentos de reconhecimento”, continuou o ministro, sob protestos de parte da plateia.

Algumas pessoas interromperam o discurso, afirmando ser o dia de Raduan e não de publicidade do governo Temer. “O golpe é dos que não conhecem a Constituição desde a Primeira República”, disse Freire. O poeta e professor da Universidade de São Paulo (USP) Augusto Massi rebateu: “Acho que você não está à altura do evento”. “O silêncio é precioso”, disse a filósofa Marilena Chaui. “Deve ser porque sou de classe média”, rebateu o ministro, em referência a um discurso da intelectual em 2013, quando ela atacou o posicionamento político desse segmento social.