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Animosidade aumenta e Lewandowski admite estender trabalhos até quinta-feira

Tons mais ácidos entre senadores e advogados de acusação e defesa mostram que trégua de cordialidade observado ontem, diante da presença de Dilma no Congresso, foi rompida de uma vez por todas

Marcelo Camargo/ABr

José Eduardo Cardozo faz a defesa do mandato de Dilma Rousseff, durante julgamento do processo no Senado

Brasília – Se o dia de ontem (29) foi elogiado por ter tido um clima ameno e cordial, apesar de provocações e até algumas farpas proferidas entre os senadores e a presidenta Dilma Rousseff, o de hoje mostrou, menos de duas horas depois de iniciada a sessão do Senado que julga o processo do impeachment, no Senado, que o ambiente será bem diferente. Foram proferidos gritos de “golpistas”, “arrogantes”, choros, ironias, queixas formais de senadores contra outros e até pedidos para que, caso algumas situações voltem a se repetir, seja providenciada a retirada, por policiais, de deputados do plenário, o que suscitou atitudes de espanto e levou à suspensão da sessão.

Entre assessores mais próximos, o ministro Ricardo Lewandowski disse no começo da manhã que estava se programando para fazer com que a sessão de hoje levasse ao término da discussão completa sobre o processo de impeachment, para que amanhã, os trabalhos se ativessem apenas à leitura do relatório dele sobre todo o rito realizado até então. E assim, pudesse ser iniciada, de imediato, a votação.

Mas diante da tensão desta terça-feira e da grande quantidade de parlamentares inscritos para se pronunciarem – ao menos 66 se inscreveram – ele admite que os trabalhos sejam encerrados mais cedo hoje (a depender da temperatura a ser observada ao longo da tarde), para que todos descansem um pouco mais e retornem mais cordiais para a continuidade, amanhã. Se isto acontecer, a votação pode se estender até a quinta-feira (1º).

O maior embate foi travado pelos advogados de acusação e da defesa. José Eduardo Cardozo, da defesa da presidenta afastada, lembrou que não é a primeira vez que a presidenta está sendo julgada e imagina quantas vezes devem ter lhe dito, por parte dos torturadores e demais integrantes da ditadura militar, que entendiam que estava sofrendo e que estavam fazendo isso “não por ela, mas pelo país”. A fala de Cardozo foi direta e dirigida ao discurso da advogada Janaína Paschoal – autora da peça do impeachment, que chorou e deu um tom cênico à sua fala.

Janaína evocou Deus, disse que admirava a atitude de Dilma de ter ido ontem ao Senado enfrentar os parlamentares que a estão julgando e dar suas explicações, embora tenha considerado que a presidenta também fez muitas críticas ao Legislativo. Acrescentou, ainda, que entende o sofrimento que, como uma das autoras do pedido de impeachment, ela impôs a Dilma. E no final, concluiu chorando que espera que, posteriormente, a presidenta afastada compreenda que ela (Janaína) agiu dessa forma “pensando no futuro do país”.

“Espero que a própria presidente Dilma venha a perceber que esta advogada agiu, também, pelo futuro dos seus dois netos”, afirmou.

Chamada por várias vezes de “patética”, na avaliação dos senadores contrários ao afastamento, a cena de Janaína, que já tinha sido observada anteriormente durante depoimento da jurista à comissão do impeachment – quando também chorou e disse que o que fazia era em nome de “brasileirinhos e brasileirinhas” – a advogada terminou sendo alvo do ex-líder do governo Dilma na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE). Ao assistir à sessão, o deputado não resistiu e disse em tom mais alto que o normal: “golpista”.

Uso de seguranças

Foi a deixa para que o atual líder do governo no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) pedisse ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que preside os trabalhos, para que se o episódio se repetir, convoque seguranças legislativos para retirar o parlamentar da sessão.

O gesto de Nunes Ferreira terminou sendo visto como de ainda maior agressividade do que o de Guimarães por parte dos senadores contrários ao impeachment. Até porque desde o início dos trabalhos nesta última etapa, os deputados têm ido constantemente até o Senado, muitas vezes alternando-se entre partidos e bancadas. E esta prática de deputados acompanhando sessões emblemáticas do Senado e senadores acompanhando sessões da Câmara tem sido comum em todo o processo legislativo, nos últimos anos.

“Isso é arrogância do senhor, não podemos permitir”, queixou-se a senadora Fátima Bezerra (PT-RN), em relação a Nunes Ferreira. A senadora Vanessa Grazziotin, após os trabalhos serem retomados – porque o ministro Lewandowski suspendeu a sessão por alguns minutos em razão do imbróglio – pediu que fossem solicitadas desculpas formais por parte do líder do governo no Senado em relação a Guimarães.

“Ele pediu a prisão de um colega parlamentar, que mesmo sendo de outra casa é um colega. E depois, quando falamos em golpe, falamos em golpe contra a democracia, contra os princípios constitucionais. Esta palavra tem sido tão mencionada e debatida nesta Casa desde o início. Qual o motivo da confusão e de tanta ofensa pelo fato da advogada de acusação ser chamada de golpista?”, indagou, em tom irônico, Vanessa Grazziotin.

Enquanto Cardozo atingiu diretamente Janaína Paschoal, coube `a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) criticar o advogado Miguel Reale Júnior que afirmou, em sua fala, que o processo de impeachment foi iniciado em vários endereços de São Paulo e Rio de Janeiro considerados locais frequentados pela elite, na visão pela senadora.

Argumento político

“Acho que a função do senhor neste momento é fazer uma última dissertação técnica e jurídica da peça que também ajudou a elaborar, mostrando os pontos que o senhor considera mais importantes deste processo. Mas o senhor se ateve a questões políticas, aqui. Inclusive mencionando como locais onde o impeachment surgiu, lugares frequentados pela elite. Nós já sabíamos disso”, ironizou Gleisi. Reale Júnior foi respondido pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), que acusou a senadora de, nos últimos dias, ter feito “ataques constantes aos senadores neste Congresso”.

Os dois advogados de acusação a Dilma voltaram a citar irregularidades na emissão de decretos de crédito suplementar e a falar na prática de pedaladas fiscais. E reiteraram que o PT e outros partidos aliados da presidenta têm feito o que chamaram de “uso de práticas midiáticas para levar a população a se convencer de que estão certos”. O comentário levou a risos entre os petistas, que têm criticado constantes ataques feitos pela mídia à presidenta afastada.

José Eduardo Cardozo resolveu explicar item por item os argumentos repetidos pelos advogados da acusação e pediu que mostrassem, de uma vez por todas, “qual o ato irregular pratico por Dilma Rousseff”.

Entre contrários ao impeachment, os argumentos repetidos hoje foram de que a fala de Dilma, ontem, incomodou ao grupo aliado do presidente provisório Michel Temer visivelmente, motivo pelo qual está sendo observado um tratamento de maior irritação entre os pares e um tom mais político por parte da acusação. Já os que são favoráveis ao impeachment afirmam o contrário e continuam fazendo manifestações no sentido de que não consideram que a presidenta tenha dito novidades durante sua ida ao Congresso.

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