Crise

Venezuela: impasse do país não permite fazer previsões

Para professor da Unesp, crise do vizinho sul-americano é complexa e não pode ser analisada de maneira maniqueísta. “Não se pode negar que morreram quase 100 pessoas e muitos são jovens', diz Ayerbe

Fabio Rodrigues Pozzebom /Agência Brasil

Ao contrário de Hugo Chávez, Nicolás Maduro (foto) não tem maioria no parlamento venezuelano

São Paulo – Envolta em uma enorme crise, a Venezuela se encontra num impasse. Cerca de 100 pessoas já morreram na onda de protestos iniciados no país há três meses. Sem o carisma e a liderança inquestionáveis de Hugo Chávez, o presidente Nicolás Maduro não consegue resolver a crise.

“Se a oposição tenta tomar o poder de forma violenta, os que apoiam o governo têm capacidade de resistência armada – grupos bolivarianos e setores coletivos que têm acesso a armas. Se Maduro continuar, a situação continua piorando. Se houver eleições e o chavismo perder, o governo que assumir vai se ver diante de uma situação tão caótica que vai ser difícil estabilizar. O país está num impasse total”, diz Luis Fernando Ayerbe, coordenador do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais da Unesp.

Além do boicote do setor empresarial, Maduro tem contra seu governo a queda do preço do petróleo (que também atingiu o Brasil), o que é catastrófico para um país cuja economia é baseada na commodity. Ao contrário de Chávez – que tinha uma situação econômica favorável, o que lhe permitiu implementar políticas distributivas, programas sociais e política exterior mais afirmativa – o atual presidente não tem maioria no parlamento. Por outro lado, aparentemente conta com o apoio das forças armadas.

Num processo relativamente semelhante ao Brasil de Dilma, a direita na Venezuela se aproveita da situação desfavorável e de erros do próprio governo para abrir espaço e tentar chegar ao poder. “É mais ou menos como no Brasil: com Lula funcionava, e com Dilma o governo se enfraqueceu – abrindo-se a brecha para a chegada de outras forças.”

Para Ayerbe, porém, no caso venezuelano, a complexidade da situação não permite a análise simplista segundo a qual os interesses dos Estados Unidos por trás da crise e a oposição a Maduro são os principais fatores do caos da Venezuela. Além da polarização do país, dividido entre governo e oposição, há uma divisão dentro da própria esquerda.

Há tanto setores da esquerda críticos a Maduro como os que defendem a necessidade de “cerrar fileiras” em torno do presidente. Há setores bolivarianos e chavistas críticos ao presidente, segundo os quais o governo é indefensável. Sem maioria parlamentar, a situação política se agrava.

“Alguns setores aliados do governo acham, de maneira maniqueísta, que tudo é uma questão do império e da direita. Mas a população está se manifestando. Não são todos os manifestantes que vão às ruas que são direitistas ou pró-americanos. Não se pode negar que morreram quase 100 pessoas e muitos são jovens”, diz Ayerbe. “A economia está terminal, a inflação altíssima, faltam produtos essenciais como remédios e alimentos e venezuelanos estão migrando ao Brasil e Colômbia.” 

Para o professor, apesar de os Estados Unidos obviamente sempre terem suas preferências, não se pode fazer uma análise que reduza a crise do país andino a uma teoria da conspiração. “Para o governo americano, é melhor ter o Mauricio Macri do que os Kirchner na Argentina. Não tanto o Temer, mas eles prefeririam os tucanos do que o PT no Brasil”, anota Ayerbe.

“Mas não acredito que o peso de fatores como boicote empresarial ou Estados Unidos seja determinante. O determinante é que Maduro não está conseguindo resolver os problemas do país. A economia da Venezuela depende em sua maior parte do petróleo, que está nas mãos do Estado. Colocar a culpa em fatores como oposição, boicote empresarial, na direita e nos Estados Unidos é insustentável. Certamente esses setores boicotam, a direita é contra e conspira etc. Mas tudo isso não é determinante na crise da Venezuela.”

Leia também

Últimas notícias