Dez anos após atentados, Europa está mais xenófoba e EUA, mais conservador

Manifestantes mostram máscara com rosto de iraniano morto por policiais em Londres, em agosto (Foto: ©Morteza Nikoubazl/Reuters) São Paulo – Um mundo menos tolerante às diferenças e mais fechado a […]

Manifestantes mostram máscara com rosto de iraniano morto por policiais em Londres, em agosto (Foto: ©Morteza Nikoubazl/Reuters)

São Paulo – Um mundo menos tolerante às diferenças e mais fechado a novos ventos. O saldo dos dez anos dos atentados de 11 de Setembro de 2001 em Nova York e Washington, nos Estados Unidos, não teria como ser positivo. A geopolítica mundial se transformou, parte das nações ricas perdeu o poder de referência e a solução encontrada por alguns foi a imposição de muros e barreiras a outras culturas.

“Muitas consequências tivemos de lá para cá. A mais sentida é o aumento do preconceito contra os povos árabes e os praticantes da religião islâmica”, lamenta Leujene Mirhan, membro da Academia de Altos Estudos Ibero-Árabes de Lisboa. “Isso é visível. Manifestações islamofóbicas são vistas nestes dez anos em muitas partes do mundo”, afirma.

O então presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, soube capitalizar o episódio politicamente, revertendo uma forte trajetória de queda de popularidade com a declaração da autointitulada “Guerra ao Terror”. Bush passou a defender o combate aos “males” do mundo árabe por meio de ações armadas no Afeganistão e no Iraque, escolhidos como representantes de povos tidos como intolerantes, antidemocráticos e – até mesmo – atrasados. 

A forte retórica forjou a imagem de nações autoritárias, fechadas ao progresso e dominadas pelo chamado “fundamentalismo religioso”, como se o problema estivesse contido no Islã, e não nos atos em si. Nas ruas de países europeus e nos Estados Unidos, o efeito foi a discriminação a cidadãos sobre os quais recaía a “suspeita” de serem árabes, povos sintetizados nas figuras de Osama Bin Laden, líder da rede Al Qaeda, e Saddam Hussein, presidente do Iraque.

Em 2010, um pastor do estado da Flórida chegou a prometer atear fogo em exemplares do Corão, o livro sagrado para os muçulmanos. Embora tenha deixado a ideia de lado na última hora, após muita pressão para evitar a manifestação de intolerância, a recepção positiva por parte da sociedade ficou clara.

Outro indicador nesse sentido foram os resultados das eleições legislativas, em novembro do ano passado, o movimento reacionário Tea Party, alojado dentro do Partido Republicano, registrou forte crescimento com uma bandeira que prega a xenofobia e outras formas de discriminação. Após o feito, aventa voos mais altos, com um eventual lançamento de candidato nas eleições presidenciais – Sarah Palin, candidata a vice na chapa derrotada encabeçada por John McCain, seria um dos nomes do grupo.

A Europa rumou por veredas semelhantes, com o crescimento de siglas de extrema-direita de discurso xenófobo. Isso se refletiu na aprovação de medidas que promovem a estigmatização e despertam preconceitos. “A Europa é um continente que tradicionalmente foi muito fechado, avesso a qualquer penetração de religiões que não sejam as de origem cristã”, pondera Mirhan.

Na Suíça, em um plebiscito realizado em 2009, a população aprovou a proibição dos minaretes, as torres características das mesquitas. O pôster principal da campanha a favor do veto mostrava uma mulher com trajes muçulmanos tendo atrás de si torres que, distorcidas no formato, se confundiam com mísseis. A França, de Nicolas Sarkozy, proibiu em 2010 o uso do véu das mulheres de religião islâmica. “Pode-se ter uma igreja com a cruz lá em cima, mas não pode ter a meia-lua, que é o símbolo do Islã, o que é uma discriminação ostensiva”, acrescenta o professor.

Mundo diferente 

A configuração política mundial mudou nos últimos dez anos, consequência de uma série de fatores que não se resumem aos ataques de 11 de Setembro. Mas os ataques às Torres Gêmeas e ao Pentágono são um episódio fundador dessa nova era. Os Estados Unidos de 2011 já não se mostram como superpotência incontestável, especialmente depois de conviver com uma crise econômica que se espalhou pelo mundo em 2008 e 2009.

Crescem ainda pressões por uma reforma nos organismos multilaterais, em especial da Organização das Nações Unidas (ONU) e de seu cobiçado Conselho de Segurança.

A crise financeira desencadeada em 2008, e desdobrada neste ano, abalou momentaneamente as certezas sobre a distribuição de forças, e por ora aparece a possibilidade de que em algum momento a China venha a superar a potência do Norte no tamanho da economia. “Nota-se hoje um caminho para a multipolaridade, mas ainda não afirmaria que o mundo deixou de ser unipolar”, adverte Mirhan. “A China tem quatro milhões de soldados, o dobro dos Estados Unidos, mas não tem a menor possibilidade de lhe fazer frente.”

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