Ex-diretor da Saúde relata ocultação de dados durante gestão de Serra

Episódio motivou demissão de Helvécio Bueno. O servidor lembra que sorrisos do ex-ministro eram só na frente das câmeras e que, nos bastidores, a má educação era regra

Helvécio Bueno deixou o Ministério da Saúde depois de Serra ordenar que omitisse índices de mortalidade infantil no Nordeste (Foto: SDS/DF/Divulgação)

São Paulo – Helvécio Bueno trabalhou durante quase 15 anos no Ministério da Saúde. Entrou em 1985 e conseguiu desenvolver seu trabalho com normalidade até 1998. Naquele ano, no dia 31 de março, José Serra assumiu a pasta do governo Fernando Henrique Cardoso – e tudo desandou na vida deste funcionário que começou a atuar na administração da área de saúde em 1982, ainda no governo do Distrito Federal.

Bueno escreveu uma carta que circula pela internet em que conta os bastidores do Ministério da Saúde, um dos grandes orgulhos da carreira do agora candidato do PSDB à Presidência da República. Logo no primeiro contato, conta, o tucano deu seu cartão de visita: entrou em uma reunião em que estava todo o primeiro escalão sem cumprimentar ninguém, pegou o chefe de gabinete pelo braço e exigiu que contasse tudo o que havia sido discutido naquela conversa. “Essa era a forma com que tratava seus subordinados, o sorriso só aparecia na presença da mídia”, resume.

Agora, em entrevista à Rede Brasil Atual, Bueno explica como foi a gota d’água, em setembro de 1999. Na condição de diretor do Departamento de Informação em Saúde, ele entregou ao então ministro uma avaliação sobre a situação de saúde no país. Quando viu os dados sobre a mortalidade infantil na região Nordeste, Serra afirmou: “Esta informação não pode sair deste ministério.”

O diretor não hesitou em apresentar sua demissão. “Foi a única experiência que tive na vida de me proibirem de publicar alguma informação como esta. Ao contrário, a gente sempre procurava dar uma divulgação, até para alertar as pessoas dos problemas que a gente tomava conhecimento no nosso trabalho”.

Bueno discorda frontalmente da ideia estimulada pelo próprio candidato de que foi ele o melhor ministro da Saúde da história. Ao longo de sua permanência no ministério, o servidor aposentado indica pelo menos três que foram muito mais importantes: Adib Jatene (cujo mandato foi de 1995 a 1996), Henrique Santillo (de 1993 a 1995) e Carlos Albuquerque (1996 a 1998). 

Em sua carta, o ex-servidor destaca o que considera ser duas inverdades que ocupam o centro da campanha tucana. O Programa de combate ao HIV/Aids foi uma criação do ministro Carlos Santana, em 1985, e o de medicamentos genéricos foi uma conquista de Jamil Haddad, em 1993, ainda no governo Itamar Franco.

Outra promessa de Serra, e que é apontada como êxito de sua gestão na Saúde, é a retomada dos mutirões da área. Para Bueno, as ações concentradas só são necessários quando se falha no atendimento de rotina, o que ocorria na gestão do agora candidato.  “Minha impressão é de que se fortaleço o serviço público, se realmente contrato profissionais, pago melhor, não deixo faltar equipamento e material, os mutirões não são necessários.”