Greve na França: o ‘day after’

Protesto em Paris, na terça-feira (7): “Aposentadoria, aos 60 para todos, mas imediatamente para eles (Sarkozy e Woelth)”(Foto: Benoit Tessier/Reuters) Foi um duro golpe para o governo de Sarkozy: a […]

Protesto em Paris, na terça-feira (7): “Aposentadoria, aos 60 para todos, mas imediatamente para eles (Sarkozy e Woelth)”(Foto: Benoit Tessier/Reuters)

Foi um duro golpe para o governo de Sarkozy: a greve geral e as manifestações convocadas pelas centrais sindicais francesas, sindicatos conexos e as oposições contra a reforma da previdência foram um sucesso.

As avaliações variam muito: a oficial disse que nas 220 concentrações em todo o país acorreu 1,12 milhão de pessoas. Para as centrais, esse número variou entre 2,2 e 3 milhões. As mais equilibradas davam entre 2,2 e 2,5 milhões. Os percentuais de adesão à greve também variavam, conforme os avaliadores; mas o importante é que ela foi “percebida” com grande intensidade em todo o país e no exterior.

O foco do conflito está na idade para se aposentar: o projeto prevê a passagem de 60 para 62 anos da idade mínima para se aposentar; e de 65 para 67 para a aposentadoria plena, isto, sem descontos quanto ao teto. Alega-se a projetada insolvência do sistema se nada mudar. Mas as críticas são muitas: o projeto nivela todas as categorias, todos os tipos de trabalho, inclusive os insalubres, homens e mulheres.

Outros protestos entraram em cena, como o dos professores no ensino público médio, em que 7.000 postos foram cortados.

Trabalhadores do setor público e privado protestaram, na terça-feira (7), contra reforma do sistema previdenciário em Marselha (Foto: Jean-Paul Pelissier/Reuters)

70 % da população, de acordo com pesquisas, se declarou favorável às manifestações de protesto, apesar dos incômodos trazidos pelas paralisações, sobretudo as de transportes e outros serviços.

Mas o mais importante foi a demonstração que isso trouxe de desconfiança em relação ao governo de Sarkozy e seu ministro do Trabalho, Eric Woerth, que é o encarregado de apresentar e defender a proposta no Parlamento. A maioria dos eleitores se disse favorável a alguma mudança na previdência, mas 60 % disseram que Woerth e o governo de Sarkozy são os menos indicados para leva-la a cabo.

Woerth está envolvido até os cabelos nas denúncias referentes ao “Caso Bettencourt”. Ele diz respeito a Liliane Bettencourt, matriarca da empresa L’Oréal, de cosméticos e afins, e há juma série de denúncias sob investigação de que ela teria obtido favorecimentos fiscais milionários e irregulares do governo, sobretudo através de Woerth. O curioso é que a principal fonte dessas denúncias são gravações clandestinas feitas em 2009 e 2010 pelo seu mordomo (que, como sempre, é o “culpado”…).

Também não se pode descartar o descontentamento da população num contexto em que – não só o governo da França, mas vários de toda a Europa – fazem cair sobre os trabalhadores e aposentados o peso e o preço de uma crise financeira provocada pela orgia financeira de instituições – bancos inclusive – cujos executivos eram e são e vão continuar a ser regiamente pagos, e ainda estão recebendo e vão receber, nem que seja indiretamente, como no caso da “ajuda à Grécia” verbas bilionárias para saírem de suas dificuldades.

O governo Sarkozy também ficou sob ataque, no mesmo dia 7, no Parlamento Europeu, em Bruxelas, onde vários deputados fizeram intervenções veementes contra o que consideram uma perseguição aos Roma (ou “ciganos” – termo que eles rejeitam, assim comom o de gipsies) através de uma política de deportação para seus países de origem, Romênia e Bulgária. Há nisso, que também ocorre na Itália, além de uma situação iníqua do ponto de vista dos direitos humanos, uma questão legal: em tese, os cidadãos da União Européia tem livre circulação por seu território, e uma política de deportação desse tipo engendra uma situação discriminatória que afronta a Constituição aprovada.

No caso das aposentadorias, pode haver alguma negociação nos próximos dias, durante os debates no Parlamento. As centrais vão manter a pressão, e tudo vai depender também de como o governo de Sarkozy vai assimilar o golpe, até certo ponto inesperado.