França: um hacker excêntrico…

Contas de Obama e Britney Spears no Twitter foram invadidas (Foto: Reprodução) Em março passado o mundo da informática e do noticiário internacional foi surpreso pela identificação e indiciamento judicial […]

Contas de Obama e Britney Spears no Twitter foram invadidas (Foto: Reprodução)

Em março passado o mundo da informática e do noticiário internacional foi surpreso pela identificação e indiciamento judicial de um dos hackers mais famosos desde abril de 2009.

Com o pseudônimo de “Hacker Croll”, o jovem francês da cidade de Clermont-Ferrand, François Cousteix, de 24 anos, desempregado, conseguiu entrar no Twitter e quebrar os códigos de acesso de vários usuários (entre eles o presidente Barack Obama e a atriz Britney Spears) e do próprio diretor administrativo da plataforma, Jason Goldman e de seu diretor presidente, Evan Williams.

O jovem nada fez de criminoso, exceto violar privacidades e divulgar na internet documentos considerados como confidenciais. Não tomou dinheiro, não clonou cartões de crédito, não estropiou o computador de ninguém, não se apossou de segredos militares… nada disso. Até agora, a única organização claramente prejudicada foi a própria Twitter, cuja credibilidade ficou abalada.

François Cousteix se considera um hacker strictu sensu, obedecendo a uma distinção de base nesse mundo onde agem praticantes de um hobby internáutico ao lado de criminosos conscientes. O hacker se considera uma espécie de esportista. É um grafiteiro do mundo virtual. Age por apostas, por exemplo, pelo gosto da aventura, do conhecimento, por espírito de desafio, pela necessidade (que pode ser compulsiva) de “deixar a sua marca”, que, em geral, é um nome de fantasia, como o de Hacker Croll. Para esse tipo de perfil, quem age motivado por interesses escusos, como se apropriar de segredos e vende-los, arrebentar com computadores alheios, se apossar de contas bancárias ou cartões de créditos, é o cracker.

Esse é um mundo de gradações cinzentas, onde tudo é possível. Por exemplo, o cracker mais famoso da história é o norte-americano Kevin Mitnick, nascido em 1962 e preso em 1995 por cometer infrações tão diversas como as de entrar virtualmente no sistema de transportes de Los Angeles para obter passes gratuitos ou violar os segredos de companhias telefônicas ou de comunicação para falar de graça ou entrar com números clonados em outros sites e iludir o FBI sobre sua identidade ou localização. Por vezes, simplesmente apostava com amigos que era capaz de entrar aqui ou ali. Mitnick ficou preso por cinco anos. Foi solto em 2000, e hoje opera uma empresa de consultoria sobre segurança para computadores. É considerado uma estrela do mundo da informática.

Hoje em dia o caso de maior repercussão é o do escocês Gary McKinnon, hoje com 44 anos, que, da Grã-Bretanha, entrou em todos os sistemas de defesa dos Estados Unidos: Nasa, Exército, Marinha, Aeronáutica, FBI, tudo. Segundo ele (que tem um diagnóstico de um tipo de autismo) estava procurando sinais de objetos voadores não identificados (OVNI, ou discos). Os Estados Unidos pediram sua extradição, e o caso está pendente na Corte britânica e deverá passar ainda pela Corte da União Européia que, com base no diagnóstico médico, poderá talvez negar a extradição.

Já o caso do norte-americano Albert Gonzales é muito diferente. Cracker consumado, jovem de 28 anos, Albert foi condenado em março deste ano por liderar uma quadrilha que faturou milhões de dólares através da clonagem de mais de 90 milhões de cartões de crédito e assemelhados. Acontece que, quando de sua prisão, veio a tona a informação (nem confirmada nem desmentida) que ele trabalhava como informante para o FBI, recebendo a soma de 75 mil dólares por ano. Esse tipo de história (de hackers ou crackers que são contratados por agências de serviço secreto, espionagem, espionagem financeira e industrial, etc. e assim obtém uma “anistia informal”) correm o mundo da internet e, é claro, são de difícil confirmação. Haveria que ser um deles, hacker ou cracker, para conseguir uma informação dessas.

Em geral, o hacker ou cracker é jovem, se inicia em suas aventuras por curiosidade mais do que por desejo de delito ou vantagem pessoal. E é, claro, um expert em informática. Pois aqui está a originalidade do caso do jovem desempregado de Clermont-Ferrand. Ele é um internauta comum, sem grandes dotes informáticos. Acontece que, nesta nossa época superpovoada por info-máquinas, ele se tornou um raro especialista, um especialista… em pessoas. A maioria das informações que precisava, como dados para descobrir senhas, palavras e respostas secretas, idade, lugar de nascimento, hobbies, etc., ele as conseguiu… estudando as pessoas! Onde? Em seus blogs, páginas, mensagens em youtubes, orkuts, etc. Até no Twitter.

Com esse método nada usual hoje em dia, estudar pessoas, ele foi longe. Tão longe que o FBI se pôs no seu encalço, alertou a polícia secreta francesa, e um belo dia uma comissão de ambas as agências foi bater à porta do “criminoso”. Ao contrário de se evadir fisicamente ou por respostas enganosas, François confessou tudo, até com um certo orgulho e espírito de cooperação, na sua casa onde brilha um pôster do Ronaldão com a camisa canarinho – como mostra a foto da AFP.

Em junho ele irá a julgamento. Pode pegar até 2 anos de prisão e uma multa de 30 mil euros (mais ou menos 72 mil reais). Mas não me surpreenderia se, ao fim e ao cabo, os seus dias de desemprego viessem a terminar definitivamente.