Balança comercial desequilibrada

Economia global fraca e discurso do governo ‘fora da realidade’ prejudicam comércio exterior

Para economista, declarações dos governantes são despropositadas, alimentam incerteza e "jogam contra" o país. Saldo comercial cai 27% neste ano

Tânia Rêgo/Agência Brasil
Tânia Rêgo/Agência Brasil
País registra queda em vários setores, como veículos de carga (-39,2%), automóveis de passageiros (-34,4%), plataformas para extração de petróleo (-31,9%) e autopeças (-18,9%)

São Paulo –De janeiro a outubro, as exportações brasileiras somaram US$ 185,437 bilhões, queda de 7,7% em relação a igual período de 2018, com base na média diária. As importações, em um total de US$ 150,614 bilhões, caíram menos: 1,5%.  A retração é significativa quando se considera o saldo comercial, de US$ 34,823 bilhões, 27,4% menor. O país sofre efeitos de um comércio global enfraquecido, mas o discurso ofensivo do governo contribui para piorar a situação, diz o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

Para ele, declarações sobre uma possível saída do Mercosul ou expulsão da Argentina, entre outras, têm influência nos negócios brasileiros. “É completamente despropositado e não contribui para a recuperação da economia brasileira. Introjeta desconfiança”, afirma Cagnin, para quem existe “uma máquina de geração de incertezas no próprio governo”.

Ele identifica um discurso geopolítico “completamente deslocado” da realidade mundial. “O discurso do governo frente ao meio ambiente e os desastres ambientais jogam contra o Brasil”, avalia o economista. “Você está jogando areia na engrenagem. Esse ruído, esse mal-estar, não é favorável para quem quer se integrar ao comércio internacional e fazer dele uma alavanca”, acrescenta.

Arte RBA

Competitividade

Além da questão político-ideológica, há o fator econômico, em um cenário de “ineficiência” do país, conforme aponta o analista. “O setor externo está contribuindo muito pouco para virarmos a página (da recuperação)”, diz Cagnin. “Do ponto de vista global, o ambiente não tem sido muito favorável. Nesse ambiente de baixo dinamismo, você tem um acirramento da concorrência”, afirma o economista do Iedi, lembrando da “baixa competitividade” brasileira. Segundo ele, é preciso criar condições para exportar artigos de maior intensidade tecnológica e valor agregado, particularmente em relação à China, país que é atualmente nosso principal parceiro comercial e com o qual o Brasil tem um perfil desfavorável no comércio.

“Isso passa pelo equacionamento de nossos problemas estruturais. Uma das principais reformas que precisamos fazer é a tributária. Como a indústria tem cadeias produtivas longas, essas distorções do sistema tributário vão se acumulando”, cita Cagnin. O Estado também demora para devolver o imposto quando você exporta. Para a empresa, isso é capital. A gente precisa de uma reforma de fato, não de outro puxadinho”, afirma o economista, que defende um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) nacional, como “o mundo desenvolvido já faz há décadas”.

Outro problema que atinge o Brasil é a crise que atinge alguns dos parceiros comerciais. Caso da Argentina, especialmente no ramo de manufaturados, como veículos automotores. De acordo com os dados do Ministério da Economia, de janeiro a outubro, as vendas para a Argentina caíram 39%, acima do resultado geral para o Mercosul – queda de 34,1% nas exportações. O país vizinho é quarto maior destino das vendas brasileiras e o terceiro país de origem das importações.

Também no ano, o país registra queda em vários setores, como veículos de carga (-39,2%), automóveis de passageiros (-34,4%), plataformas para extração de petróleo (-31,9%), autopeças (-18,9%), aviões (-15,5%), óleo de soja em bruto (-37%), couros e peles (-22%), açúcar em bruto (-18,8%), soja em grãos (-22,9%) e minério de cobre (-15,3%). As exportações para os Estados Unidos, país ao qual o atual governo se alinhou automaticamente, aumentaram 1%, enquanto as importações cresceram 6,1%.