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‘Estatais não dependentes’ para securitizar dívida ativa lesam a sociedade

Enquanto empresas como Eletrobras, Casa da Moeda e joias como Cemig, Cedae, entre centenas de empresas estatais, são privatizadas, novas “empresas estatais não dependentes” estão sendo criadas para operar esquema financeiro fraudulento

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PBH Ativos S/A é exemplo de “empresa estatal não dependente”, criada para operar esquema financeiro fraudulento

O modelo de securitização de créditos em expansão no Brasil constitui a materialização da financeirização em sua forma mais violenta, ilegal e inescrupulosa, atingindo diversos entes federados – União, Estados e Municípios – com risco de aniquilamento das finanças públicas e comprometimento das futuras gerações.

Enquanto empresas como Eletrobras, Casa da Moeda e joias como Cemig, Cedae, entre outras centenas de empresas estatais, são privatizadas, novas “empresas estatais não dependentes” estão sendo criadas para operar esquema financeiro fraudulento, a exemplo da PBH Ativos S/A em Belo Horizonte e a CPSEC S/A em São Paulo.

Tais empresas servem de fachada para que o ente federado (União, Estado ou município) faça uma operação de crédito ilegal e extremamente onerosa, obtendo recursos no mercado financeiro graças à venda de derivativos financeiros com garantia pública – disfarçados de debêntures sênior – que são vendidos com esforços restritos, sem o registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), oferecendo remuneração exorbitante aos bancos privilegiados que têm acesso a esse negócio.

A elevada remuneração oferecida pela empresa está sendo paga com recursos arrecadados de contribuintes, e que nem sequer chegarão ao orçamento público, pois ainda na rede bancária são desviados para uma “conta vinculada” a essa empresa.  

No caso de Belo Horizonte, onde a Câmara Municipal realiza uma CPI sobre a PBH Ativos S/A, foi constatado que a garantia pública concedida a essa empresa foi superior a 440% do valor recebido: o município recebeu R$ 200 milhões e se comprometeu com R$ 880 milhões, acrescidos de atualização monetária (IPCA), e ainda paga 1% ao mês. Devido à ilegalidade na concessão dessas garantias, que configuram uma forma de endividamento não autorizado, elas são disfarçadas de debêntures subordinadas, entregues pela empresa ao município. Mais papéis financeiros!

O dano ao Estado é imenso, com impactos atuais e futuros, conforme alertado inclusive por órgãos de controle (Ministério Público de Contas, Tribunal de Contas da União), que têm se manifestado contrários a esse negócio. Ainda assim ele se alastra e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, procura implementá-lo também em âmbito federal.

É um esquema ilegal. Porém, projetos em andamento no Congresso Nacional objetivam dar segurança jurídica a esse crime (PLS 204/2016, que tramita no Senado e os projetos PLP 181/2015 e PL 3337/2015 da Câmara dos Deputados).

Esse tipo de securitização é semelhante ao que provocou a crise de 2007 nos EUA e também na Europa a partir de 2010. Porém, o modelo que está sendo implantado no Brasil é ainda mais grave, pulverizado pelos entes federados de todas as esferas.

Ainda há tempo de reverter esse esquema no Brasil, mas para isso a sociedade precisa conhecer e divulgar esse novo mecanismo perverso. A Auditoria Cidadã da Dívida tem produzido materiais, a exemplo do folheto disponível em https://goo.gl/NScngN e Vídeo/animação disponível em https://goo.gl/vo9Bys.

Seminário internacional sobre o tema ocorrerá em Brasília, de 7 a 9 de novembro de 2017, com a presença de especialistas nacionais e internacionais. O objetivo é reunir especialistas, acadêmicos, juristas, políticos e militantes  para analisar a atuação do Sistema da Dívida no Brasil e em outros países da Europa e América Latina, com foco na atuação dos recentes mecanismos financeiros perversos que aprofundam a financeirização e provocam simultaneamente a geração de dívida, o sequestro de arrecadação e o seu desvio ao setor financeiro, a fim de lançar luz sobre o tema e articular ações concretas em âmbito nacional e internacional nos diversos campos – jurídico, legislativo, acadêmico, social e político – visando a popularizar o conhecimento desses mecanismos e combatê-los.

*Maria Lucia Fattorelli é Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida

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