'Cara de pau'

Para economista, volta do pato à Avenida Paulista é hipocrisia da Fiesp

'Quando o desemprego disparou para 14 milhões de pessoas, não teve pato', ironiza Guilherme Mello. Para deputado Enio Verri, aumento de imposto mostra que o governo gastou muito mais do que podia

Fábio Vieira/FotoRua/Folhapress

Fiesp reclama por aumento de imposto, mas apoiou ajuste e quem paga o pato é o trabalhador

São Paulo – Nesta sexta-feira (21), o pato amarelo voltou à Avenida Paulista, em frente à sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).  A instituição protesta contra ao aumento das alíquotas do PIS e da Confins sobre combustíveis, que tem impacto não apenas sobre o setor industrial, mas em toda a economia.

O presidente Michel Temer disse que “a população vai compreender, porque este é um governo que não mente, não dá dados falsos”. Segundo ele, a medida tem o objetivo de “manter o critério da responsabilidade fiscal, a manutenção da meta, a determinação para o crescimento”, conforme declarou ao chegar à Argentina na noite de ontem (20).

Para o economista Guilherme Mello, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na verdade não há motivos para a Fiesp reclamar. “O pato é de borracha, mas a cara é de pau. É hipócrita colocar o pato de volta agora apenas porque aumentou o imposto. Quando o desemprego disparou para 14 milhões de pessoas, quando a fome começou a voltar a reinar no Brasil, quando os salários caem, quando o trabalhador perde direitos, não tem pato. Agora, quando sobe imposto, que pode eventualmente afetar um pouco a rentabilidade dos industriais, eles reclamam”, diz. “É sempre o pobre e o trabalhador que pagam o pato.”

Mello lembra que, ao contrário de trabalhadores e da parcela mais pobre da população, os industriais representados pela Fiesp – uma das primeiras entidades de classe a embarcar na defesa do impeachment – têm benesses, incentivos e apoios. “E enquanto isso defendem corte dos programas sociais, no investimento público, na saúde, na Previdência. Eles pediram ajuste fiscal, pediram Joaquim Levy, Henrique Meirelles, a reforma trabalhista. Querem a reforma da  Previdência, e disseram que os salários estavam muito altos. A crise brasileira é consequência do receituário que eles pediam, e agora inflam o pato novamente.”

No mesmo sentido, o deputado federal Enio Verri (PT-PR) lembra que as políticas recessivas que foram implementadas são as do interesse do capital financeiro, e que havia acordo entre governo e empresários segundo o qual não haveria aumento de impostos. “Mas a verdade é que aumenta o imposto porque o governo gastou muito mais do que podia. Agora eu quero ver o Paulo Skaf (presidente da Fiesp) explicar isso”, afirma.

Para Verri, o aumento da carga tributária alimenta ainda mais a recessão. Para o conjunto da economia, com aumento de imposto, o pequeno e médio empresário não conseguem repassar o aumento. Terão de diminuir o lucro e podem até ter prejuízo. Logo, vão ter de demitir.

Na Argentina, Temer disse que o aumento diz respeito, em primeiro lugar, à “responsabilidade fiscal” do governo. “Em segundo lugar, para assegurar o crescimento econômico que pouco a pouco vem vindo. Vocês estão percebendo que, aos poucos, o crescimento vem se revelando”, acrescentou.

Além do aumento tributário, o governo vai contingenciar R$ 5,9 bilhões de despesas não obrigatórias do Orçamento, segundo a Agência Brasil