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Temer usa BNDES para ‘comprar apoio político’, diz economista

Presidente oferece renegociação de dívidas dos estados com o banco para obter apoio político e enfrentar possível denúncia de Janot. 'É inaceitável usar o BNDES para esse fim', avalia João Sicsú

Valter Campanato/ABr

Para o economista João Sicsú, ação de Temer no atual contexto “é uma clara interferência política”

São Paulo – O presidente Michel Temer reuniu governadores de diversos estados para um jantar, na última terça-feira (13), no Palácio da Alvorada. No menu, foi servida a possibilidade de renegociação das dívidas dos estados com o BNDES.

Embora a pauta não seja nova, integrantes do próprio governo Temer reconhecem que a retomada do assunto é uma ação para angariar apoio político dos governadores e suas respectivas bancadas, num momento em que o presidente está prestes a ser denunciado por corrupção pela Procuradoria Geral da República (PGR).

Coincidentemente, o jantar de Temer com os governadores ocorreu horas depois de deputados e senadores de diversos partidos lançarem a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Bancos Públicos, com apoio de economistas, entidades do setor bancário e da sociedade civil.

Para o economista João Sicsú, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e um dos mentores da criação da frente parlamentar, a utilização dos bancos públicos para fins políticos é algo “inédito” e “gravíssimo”.

“É inaceitável usar o BNDES para esse fim. Ele está comprando apoio político, se aproveitando do momento de fragilidade dos estados”, afirmou o economista, destacando que não se pode criminalizar as atividades do banco público, como vem sendo feito recentemente, mas que a ação de Temer no atual contexto “é uma clara interferência política”.

“O BNDES tem que ter projeto, pode-se concordar ou não com o Luciano Coutinho (ex-presidente do banco até maio de 2016), mas havia projeto. Agora, fazer troca-troca por apoio político é inédito. Essa é a questão. Acho gravíssimo esse aspecto.”

João Sicsú pondera que uma crítica recorrente à gestão dos bancos públicos é que eles seriam conduzidos de forma “apadrinhada”, mas ele ressalta que os resultados não comprovam isso, já que os bancos públicos tem um grau baixo de inadimplência. Entretanto, o economista e professor da UFRJ destaca que essa forma “apadrinhada” é justamente o que Temer está fazendo agora.

Sicsú ainda lembrou da decisão do governo, em dezembro de 2016, de antecipar pagamentos do BNDES ao Tesouro Nacional em um total de R$ 100 bilhões em financiamentos obtidos com a União entre 2008 e 2014. Para o economista, a intervenção na época até poderia ser discutida, mas havia um objetivo fiscal, ao contrário de agora, em que o gesto de renegociar as dívidas dos estados adquire ares de barganha política por alívio ao caixa dos estados.