Após tragédia

Doria e França revelam desconhecer drama das ocupações, diz urbanista

Ex-prefeito chegou a dizer que prédio que desabou era ocupado por 'facção criminosa'. Já o governador disse que pessoas que morar em ocupações é 'procurar encrenca'

Divulgação/Corpo de Bombeiros

“‘Indústria da ocupação’ não é feita pelos ocupantes, mas sim pelo próprio poder público”, ressalta urbanista

São Paulo – Nesta terça-feira (1º), o ex-prefeito da capital paulista, João Doria (PSDB), afirmou em Ribeirão Preto, sobre a tragédia ocorrida com o desabamento de uma ocupação no centro de São Paulo, que “o prédio foi invadido e parte desta invasão financiada e ocupada por uma facção criminosa”. Já o governador Márcio França (PSB) disse que morar em prédios ocupados como o que desabou era “procurar encrenca”. 

Para a coordenadora de projetos da área de Urbanismo do Instituto Pólis, Danielle Klintowitz, as falas dos políticos revelam preconceito e desconhecimento sobre o problema habitacional, no Brasil e em São Paulo.

“Estou muito chocada com a atitude destes gestores porque são falas preconceituosas e com um desconhecimento grande da problemática habitacional. Eles, que deveriam ser responsáveis por uma política pública adequada, têm essa visão preconceituosa”, afirmou a urbanista, em entrevista à jornalista Marilu Cabañas, na Rádio Brasil Atual nesta quarta-feira (2). “Ocupações são feitas por trabalhadores que não conseguem ter acesso a uma moradia adequada”, ressaltou. 

Ela acrescentou ainda que esse discurso é uma tentativa de trazer a opinião pública a favor de reintegrações de posses e de criminalizar os movimentos sociais. “Existe muito interesse em torno desses imóveis, uma vontade grande do governo federal e de outras instâncias de vender esse patrimônio público.”

Segundo Danielle, as políticas públicas no setor de habitação não contemplam a parcela da população mais pobre, que acaba sem acesso ao direito fundamental de moradia.

“Ou são políticas que abrem novas frentes e levam a população a uma periferia sem equipamentos públicos, que piora a sua qualidade de vida, ou como as que vemos hoje em São Paulo, parcerias público-privadas que não incluem a população de baixa renda”, pontuou. “São políticas excludentes que geram esse tipo de ocupação. A ‘indústria da ocupação’ de que fala o governador não é feita pelos ocupantes, mas sim pelo próprio poder público.”

A prefeitura de São Paulo afirmou que vai encaminhar as famílias desabrigadas para que recebam o bolsa-aluguel. O valor do auxílio corresponde a R$ 1,2 mil no primeiro mês e R$ 400 nos meses posteriores. A coordenadora do Instituto Pólis disse que o valor é insuficiente. Com isso, não seria possível alugar sequer uma moradia em um cortiço, que custa em torno de R$ 900 no centro de São Paulo, de acordo com ela. “E a população vai ocupar novos lugares.”

Ouça a entrevista:

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