Ontem e hoje

Comissão Especial aponta democracia política ainda incompleta

Caráter militar do interventor no Rio e mandados coletivos de busca são medidas contrárias às recomendações feitas pela Comissão da Verdade e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos

Marcelo Camargo/Agência Brasil

O general Braga Netto, interventor no Rio: agentes do Estado não podem ter liberdade irrestrita, ameaçando direitos fundamentais

São Paulo – A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos divulgou nota para repudiar declarações atribuídas ao general Eduardo Villas Boas, de que o Exército precisaria de “garantias” para atuar durante a intervenção no Rio de Janeiro sem a perspectiva de uma comissão da verdade.  “As comissões da verdade são instrumentos essenciais à implementação da Justiça de Transição, a qual compreende, além da abertura de arquivos da repressão, a localização dos corpos das vítimas dessas violações, a responsabilização de seus autores, a revisão dos modos de atuação das instituições, tudo visando à não repetição”, diz o colegiado.

Para a Comissão Especial, a restauração da democracia política, a partir de 1988, “ainda não se concretizou de maneira suficiente para remover todos os elementos de autoritarismo construídos no curso da ditadura”, como mostram as “diversas quebras da legalidade na vida nacional recente”. Isso está presente, também, na intervenção federal no Rio.

O fato de o interventor ser militar e os projetos de mandados coletivo de busca, de constitucionalidade “questionável”, ressalta a Comissão, “são medidas absolutamente contrárias às recomendações de desmilitarização feitas pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) e da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que condenou o Estado brasileiro por graves violações aos direitos humanos no caso da Guerrilha do Araguaia”.

A Comissão cita arecente identificação, entre as ossadas da vala clandestina do Cemitério Dom Bosco, em Perus, do desaparecido político Dimas Antônio Casemiro, morto em abril de 1971 por agentes do Estado, após tortura, o que “demonstra inequivocamente a violência e a ilegalidade do período”.

“Foi por conta do trabalho de comissões como esta e como as comissões nacional e estaduais da verdade que o conjunto da sociedade brasileira pôde saber que os registros oficiais simularam as condições nas quais a morte de Dimas efetivamente ocorreu”, afirma a nota, assinada pela presidenta da Comissão Especial, a procuradora da República Eugênia Gonzaga.

“O que torna cada indivíduo mais seguro é a certeza de que seus direitos e garantias fundamentais serão preservados e não a liberdade irrestrita para que os agentes do Estado atuem segundo seu próprio juízo, sem prestar contas àqueles que, em última instância, são os responsáveis pela sua própria existência, os cidadãos brasileiros. As comissões da verdade se fazem necessárias exatamente quando os agentes do estado se autoconcedem mecanismos de impunidade caso atuem em desacordo com os diplomas legais em vigência.”

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