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Grande mídia convocou a classe média em 2013, diz integrante do MPL

Integrante do Movimento Passe Livre avalia Jornadas de Junho quatro anos depois

MÍDIA NINJA

Quando viu que não conseguiria deslegitimar as reivindicações por transporte público de qualidade, grande mídia passou a tentar manipular a pauta, atraindo uma classe média despolitizada

Brasil de Fato – As chamadas Jornadas de Junho completaram quatros anos. Como fenômeno histórico recente, a interpretação de seu significado histórico ainda se encontra em aberto. Em entrevista, Diego Soares Thiago, integrante do Movimento Passe Livre (MPL), organização que convocou os primeiros atos em 2013, contrários ao aumento das tarifas do transporte público em São Paulo, afirma que junho de 2013 ainda não teve todos seus frutos políticos colhidos. De outro lado, analisa a mudança do caráter das manifestações ao longo de todo o processo: “A grande mídia, quando viu que não conseguiria deslegitimar as reivindicações, passou a tentar manipular a pauta. De uma certa forma, convocou a classe média a ir também. Uma classe média despolitizada”.

Confira a íntegra abaixo:

Vamos começar pelo fim: qual foi o legado de 2013, das ações que o MPL teve enquanto linha de frente dos atos?

O legado é que temos uma ressignificação da democracia. A partir de 2013, você vê as pessoas discutindo política no ônibus, no metrô, no trabalho. Claro que está longe do ideal, mas 2013 foi uma espécie de “restart” do país. As Jornadas de Junho deixaram uma vontade de democratizar a democracia. 

Teve o passe livre estudantil. Um legado de que se você vai para rua e reivindica, você consegue as coisas. Se você se organizar, é possível conseguir algumas pautas. 

Hoje, como o MPL vê aquele momento?

Um momento em que o movimento se propagou. Foram vários anos de trabalho de base e vários fatores contribuíram para ele acontecer, fatores externos, mas também muito trabalho do próprio movimento. 

Foi um momento que ainda pode trazer frutos. É recente, ainda não colhemos todos os frutos de 2013. 

Durante os protestos de 2013, organizações “tradicionais” de esquerda foram rechaçadas. Como vocês analisam esse processo?

Na verdade, o movimento é apartidário, mas aceita o apoio dos partidos. Do primeiro ao terceiro ato, a esquerda tradicional estava presente, incluindo parte da Juventude do PT, com suas bandeiras. Todo mundo que quer lutar contra a tarifa é bem recebido. 

Os grandes meios de comunicação tentaram deslegitimar a pauta. Não conseguiram. A grande mídia, quando viu que não conseguiria deslegitimar as reivindicações, passou a tentar manipular a pauta. De uma certa forma, convocou a classe média a ir também. Uma classe média despolitizada.

A partir do quarto ato, no qual apareceu uma galera que nunca tinha ido em manifestação, se misturou com uma direita semi-organizada, que manipulou grande parte da população que nunca teve um contato com a militância política, e começou a hostilizar os partidos tradicionais. A maioria das pessoas que hostilizou indica um modelo no qual as pessoas já não se vêem representadas. Ali não tinha partido de direita, mas qualquer partido que estivesse ali seria hostilizado. Mas isso não partiu do MPL, mas sim de algumas pessoas que se infiltraram.

O MPL defende um modelo de organização distinto. Como era e como é a relação do MPL com estas organizações “tradicionais” da esquerda brasileira?

Lidamos hoje da mesma forma que em 2013. Por exemplo, a gente tenta parceria com o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto). Parceria, que eu digo, é um apoio nas lutas. Eles têm os métodos deles, a forma de se organizar. A gente respeita, mas a nossa maneira… Claro que é uma utopia na sociedade capitalista, mas o horizonte é a horizontalidade. 

O MPL continua focado na questão do passe livre?

O movimento é por transporte público. A gente consegue aglutinar um número de militantes que têm consenso nesse ponto. São militantes de esquerda, desde anarquistas até social-democratas. Isso não significa que esses militantes não atuem em outras pautas, mas quando atua enquanto MPL é pelo transporte, pelo direito à cidade.

E qual a agenda do MPL nesse momento?

Existe uma agenda, mas também existe a conjuntura nacional: um momento de ataque contra as leis trabalhistas, a questão da Previdência. Isso deixa a pauta do transporte, de certa forma, em uma posição secundária.

A gente pretende convocar atos, mas esses atos têm de ser construídos, com muito trabalho de base. Não basta só chamar o ato, que ele não acontece. A gente está indo quase todo dia nas periferias, tentando construir para ver se conseguimos fazer uma mobilização grande ainda esse ano.

O MPL pretende se somar de alguma forma a outras bandeiras, como a que defende a convocação de eleições diretas?

Não significa que não há militantes que defendam “diretas já”, mas como movimento que luta por transporte, dificulta. É claro que um dos objetivos do movimento é que com a mobilização do transporte surjam outras mobilizações. Uma coisa está ligada na outra.  A pauta do transporte pode ser utilizada para ser um combustível nas outras lutas, na questão de todos os ataques que a classe trabalhadora vem sofrendo. 

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