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Festival no Capão Redondo reforça papel da periferia como polo de cultura

Com shows de jazz, rap, rodas de conversa, oficinas de dança, fanzine, horta, reciclagem, escuta criativa e gastronomia periférica, primeiro Festival do Capão atraiu cerca de 500 jovens

Divulgação

Festival do Capão combate a desigualdade urbana por meio da dança, música, gastronomia e debates

São Paulo – No início do século 19, o Capão Redondo era lembrado como a região de São Paulo que tinha um enorme aglomerado de araucárias, formando uma ilha de árvores (um capão) de 50 quilômetros de diâmetro em meio à paisagem rural – daí o nome do bairro. Hoje, a lembrança de muitos paulistanos sobre o distrito ainda remete a questões de violência, falta de moradia digna e ausência de equipamentos sociais para dar conta de uma população de cerca de 300 mil habitantes. 

Entretanto, na última quinta-feira (11), quando aconteceu o primeiro Festival do Capão, o bairro se apresentou de um modo muito diferente: como um polo de manifestações culturais, em plena tarde ensolarada de São Paulo. O evento – que teve o apoio da Oxfam Brasil e foi realizado em parceria com a TV DOC e a Fábrica de Criatividade – proporcionou troca de experiências políticas e sociais entre os coletivos de juventude organizados da zona sul de São Paulo. Houve shows de jazz, rap, rodas de conversa, oficinas de dança, fanzine, horta, reciclagem, escuta criativa e gastronomia periférica.

“É importante combater a desigualdade urbana dando espaço às lideranças da comunidade para mostrarem o que é feito de bom naqueles locais. Essa foi a proposta do Festival do Capão”, explica Tauá Pires, assessora política da Oxfam Brasil. “A história da cidade de São Paulo não pode deixar ser contada sem a inclusão da periferia.”

Para Eliane Dias – diretora da Boogie Naipe, que administra shows e eventos do grupo Racionais MC’s e de Mano Brown –, as mulheres que participam desse tipo de evento são aquelas que não aceitam o “não” como resposta. “Se eu aceitasse o ‘não’, nem teria nascido, pois sou filha de mãe solteira pobre, negra, que teve de viver na rua e sofreu muito para crescer”, disse ela, que também é coordenadora do S.O.S. Racismo, programa antirracismo da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.

RBA
Eliane Dias, Karol Oliveira e Jenyffer Nascimento participaram do debate “Juventude, Gênero e Identidade”

Eliane participou da roda de conversa “Juventude, Gênero e Identidade”, moderada por Karol Oliveira, ao lado de Jenyffer Nascimento, da revista Fala Guerreira. “Na minha época, tinha de usar calça larga e camiseta para ser uma menina aceita na visão machista do hip-hop. Hoje não precisamos mais nos masculinizar, é lindo sermos da forma como somos, sem se prender a clichês ou afetar nossa autoestima”, disse Jenyffer, que é negra, escritora e militante feminista no Coletivo Rosas.

O debate de “Literatura Marginal” teve a participação de Isaac Souza, do coletivo Núcleo de Jovens Políticos; Bruno Capão, da Associação Lado B; e Daniel Farias, da Literatura Marginal. Os três autores explicaram como a proposta, até pouco tempo vista como subversiva, consegue chegar mais facilmente à juventude porque usa sua linguagem, com palavrões e gírias, para narrar o dia a dia da comunidade.

“É uma literatura que, de certa forma, dá voz a essa população, mostra sua realidade”, explicou Isaac Souza. “Se você acha que não gosta de ler, pelo menos, carregue um livro na sua mochila. Uma hora você vai querer saber o que está escrito lá dentro, e a aventura vai começar”, disse Bruno Capão. “Sua vida é um livro, mano. Então, trate de ler para aprender como escrevê-la direito”, ponderou Daniel Farias. 

Oficinas de horta, reciclagem, forró, jazz, danças urbanas, escuta criativa, gastronomia periférica e shows de encerramento completaram as atrações do Primeiro Festival do Capão.  

Com informações da Oxfam Brasil