Carta Aberta

Militante negro contesta Fernando Holiday: ‘Racismo é questão subjetiva, mas material’

Carta aberta afirma que vereador, envolvido em caso de corrupção, não tem legitimidade para falar em nome dos negros para se opor a conquistas sociais

Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Segundo o militante Hermínio Porto, negro que trabalha pela causa opressora age como tal

São Paulo – Em carta aberta endereçada ao vereador paulistano Fernando Holiday (DEM), divulgada na semana passada, o militante do movimento negro Hermínio Porto questiona as reações do vereador ao se ver envolvido em denúncia de corrupção, por suposto uso de caixa 2 durante sua campanha eleitoral. Holiday, que construiu sua imagem com discurso “contra o ‘vitimismo’ dos pobres, negros e homossexuais”, agora se diz vítima desses mesmos preconceitos.

Tendo adotado práticas da chamada velha política, Holiday diz estar sendo perseguido por “seu jeito novo de fazer campanha”, que incomodaria determinados setores que “não admitem que haja um negro dentro do parlamento, contrário às cotas raciais e que não se submete à sua militância negra”.

Hermínio Porto rebate: “Eu não admito na Câmara qualquer pessoa, negra ou branca, que seja contrária às cotas raciais, ou qualquer outra política pública para negros. Mas Fernando Holiday é negro, e se acha, por conta disso, legitimado para falar em nome de todos nós”.

Carta aberta a Fernando Holiday de um negro para outro negro

O democrata Fernando Feriado (DEM-SP), aquele que construiu uma legislatura contra o holiday da consciência negra, entra na frente sul-americana de batalha, iniciada por Trump (o que salvou a América do socialismo-democrata de Berni… Hilary!), contra o FAKE NEWS.

Tudo começou quando a intrépida jornalista Tatiana Farah, do site BuzzFeed Brasil (site que todos conhecemos por listas tiradas de pérolas do Twitter), publicou uma matéria que denunciava Caixa 2 na campanha de Holiday. Dada a repercussão da acusação, Fernando Holiday foi convidado a dar entrevista por telefone a Fábio Pannunzio da Rádio Bandeirantes.

Como “confusão” é palavra usada por jornalismo ruim que nada esclarece, vamos ao que aconteceu nos quase quatro minutos de “entrevista”: (I) o jornalista iniciou a entrevista com a convicção formada a respeito da culpa do suspeito, que é negro. (II) Por meio de tom intimidatório, deixou o acusado em situação desconcertante; (III) fazendo com que logo perdesse o controle sobre suas emoções. (IV) O acusado grita, desesperado para provar a inocência, e (V) logo é acusado de mal-educado pelo jornalista que encerra a entrevista. Nada de novo no jornalismo brasileiro: a narração que vemos aqui poderia muito bem ser aplicada a algum repórter de noticiário sangrento de algum programa de televisão como Brasil Urgente, também do Grupo Bandeirantes. Mais uma vez o negro foi colocado como um “marginal”.

Mas em respeito ao Vereador, não vamos colocá-lo na posição de vítima do jornalismo brasileiro. Lembremos que toda a sua campanha e legislatura se dão contra o “vitimismo” dos pobres, negros e homossexuais. Pannunzio repetiu o jornalismo ruim das grandes mídias; mas seu maior demérito foi não ter deixado Holiday falar. Por isso, vamos nos atentar mais ao vídeo divulgado pelo próprio Fernando.

Primeiro o vereador começa seu ataque ao site e à jornalista, que é acusada de apoiar o PT e o PSOL. E eis a primeira contradição: se é mentira tudo o que é dito por jornalista com posição política, então o próprio vereador não deveria dar tanto crédito a denúncias contra o PT feitas pelo “jornalismo” da Veja e da Globo, que por sua vez, são veículos de imprensa nitidamente de direita. Logo, se o que se falou do Holiday pela Tatiana Farah é mentira, o que se falou do Lula pelo William Waack também é?!

Depois diz que há um incômodo pelo jeito novo de se fazer campanha. Eu desafio o Fernando Holiday a provar a novidade em: (I) fazer parte de um partido envolvido em várias denúncias de corrupção, (II) fazer campanha de ódio contra movimentos, partidos e conquistas sociais à esquerda, (III) usar a internet e compartilhamentos por parte de seguidores (GRANDE NOVIDADE, COMO NINGUÉM MAIS TINHA PENSADO NISSO?!) e, claro (IV) uso de dinheiro não declarado à justiça eleitoral (caixa 2 se fosse petista) para pagar panfleteiros. O “inventor da roda” das campanhas eleitorais cai no “eterno retorno” de criticar a Dilma.

É um niilista, que procura preencher o vazio da política com a demonização de determinadas personalidades.

Mas Fernando Holiday é “Legal”, amigo da Lei e inimigo da corrupção. Então ele vem com seu grande trunfo, que nós, conspiradores-bolivarianos-militantes não esperávamos, o Art. 27 da Lei 9.504/97 que diz:  “Qualquer eleitor poderá realizar gastos, em apoio a candidato de sua preferência, até a quantia equivalente a um mil UFIR, não sujeitos a contabilização, desde que não reembolsados.”

Se eu fosse o Pannunzio, teria deixado o vereador explicar este artigo num verdadeiro malabarismo de hermenêutica jurídica. Eu adoraria perguntar se o problema de Fernando Holiday é não entender do que é acusado ou não conseguir interpretar o texto legal (ou o que é pior: tirar o cidadão de ignorante). Pois, o que tem a ver um artigo que fala que o “eleitor pode realizar gastos” com o “eleitor que recebe R$ 60,00 para fazer campanha”? Será que eles pagaram a própria força de trabalho? Ninguém falou em um militante super engajado que desembolsou dinheiro para a campanha do então candidato. Mas de um candidato que desembolsou dinheiro sem declarar à Justiça Eleitoral.

Mas num ponto, falando por mim, que sou negro, o vereador tem razão: eu não admito na Câmara qualquer pessoa, negra ou branca, que seja contrária às cotas raciais, ou qualquer outra política pública para negros. Mas Fernando Holiday é negro, e se acha, por conta disso, legitimado para falar em nome de todos nós. Mas há algo que preciso ressaltar aqui: não existe superioridade moral alguma em ser um oprimido. E eu não nego que Holiday, por ser negro, de classe baixa e homossexual, seja um oprimido. Mas quando está trabalhando pela causa opressora, não age de modo tão diferente daqueles negros que se submeteram ao UNDAR, imposto pelos brancos, para, por meio da vassalagem, agirem contra outros negros.

Nossa legitimidade, Fernando, vem de nossa luta. Nossa legitimidade vem de nos recusarmos a perpetuar este longo histórico de escravidão, exclusão social e genocídio negro. Um negro na política não significa que somos livres e temos poder político enquanto negros. O racismo não é mera questão subjetiva, mas material: significa mais mortes, mais encarceramento, menos espaço para negros e salários menores. E eu não espero que você aceite o argumento da História, quando nega seu próprio histórico apagando todas os seus vídeos anteriores à sua campanha. Vídeos em que chamava de “vermes” aquele que lutam contra o racismo.

Minha solidariedade a ti, vai ao limite de você não sofrer tudo aquilo que o nosso povo sofre. Não te quero longe das universidades; nem encarcerado em prisões terríveis e muito menos morto. Eu te quero vivo, por mais que te veja engrossando as fileiras de uma política racista, machista e classista. Lembre-se, Fernando Holiday, que um negro que age contra nós negros, é como um austríaco que atacou a Áustria.

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