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Mobilidade em São Paulo é um ‘desastre’, diz secretário em debate sobre Plano Diretor

Participantes de encontro condenam prioridade ao transporte individual das gestões Serra/Kassab e pedem ao governo Haddad mais restrições ao uso de automóveis

©Luiz Guarnieri/Folhapress

Revisão do Plano Diretor deve dar prioridade em investimentos na capital paulista deve ser o transporte coletivo

São Paulo – No quinto debate de revisão do Plano Diretor Estratégico de São Paulo, na noite de ontem (8), os participantes cobraram restrição ao uso do carro, prioridade para o transporte coletivo e inclusão da bicicleta como elemento estrutural e não como modal secundário. Houve consenso de que o plano atual, de 2002, foi desvirtuado para favorecer o transporte individual. O debate ocorreu no Centro Cultural São Paulo, no Paraíso, região central da cidade.

O secretário Municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco, chegou a chamar de “desastre” a situação da mobilidade na capital. Ele defendeu a racionalização do uso de diferentes modais e investimentos no transporte coletivo.

“Precisamos de mudanças profundas. O foco de investimento deve ser o transporte de massa. A condição de uso do carro hoje tem de ser superada. O plano diretor pode e deve pressionar nesse sentido”, disse Franco.

Já o promotor público Maurício Ribeiro Lopes propôs a radicalização das ações contra o transporte individual. “Hoje o horário de pico em São Paulo é 24 horas por dia. Então o rodizio também deve ser o dia inteiro. É preciso preparar a classe média para usar o transporte público, restringindo o uso do carro. É necessário, inclusive, que a gestão Haddad tenha coragem de enfrentar a questão do pedágio urbano, temos que discuti-la. São necessárias estratégias punitivas para coibir o uso do automóvel”, afirmou Lopes. A necessidade de restrição foi ressaltada por vários outros participantes.

Para o diretor do Departamento de Urbanismo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Anderson Kazuo Nakano, as obras realizadas nos últimos anos não alcançaram os objetivos do plano.

“É muito claro, na análise dos dados, como se desvirtuou a priorização do transporte coletivo. A duplicação da Marginal Tietê, por exemplo, não estava no plano. Custou R$ 2 bilhões e não se pensou em implementar um corredor de ônibus. Esse dinheiro poderia servir à expansão do metrô, mas foi aplicado ao transporte individual”, explica.

Descaso

Os dados apresentados durante o debate mostraram que as gestões de José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (PSD), entre 2005 e 2010, quase nada investiram em mobilidade. Dos 325 quilômetros de corredores previstos no Plano de 2002, apenas 85 (26%) foram construídos, sendo 71 no governo da petista Marta Suplicy (2001-2004). O próprio plano de mobilidade nunca foi instituído. A gestão Kassab chegou a reservar R$ 15 milhões para elaboração desse plano em 2010, mas nada saiu do papel.

“Isso fez com o que o Plano Diretor ficasse capenga”, aponta Nakano. “O plano reúne diretrizes que não sendo muito genéricas, são fundamentais para dar ruma à cidade, mas as políticas de cada área devem ter um planejamento específico”, completa.

O diretor também pontuou a retomada de uso do transporte coletivo, após 35 anos de queda nas estatísticas (de 1967 a 2002), com a instituição do Bilhete Único. O que também representou a inversão dos índices de uso do carro, que vinham subindo constantemente no período. “O Bilhete Único reduziu o custo e propôs uma integração do sistema que não pode ser ignorada”, conclui.

Bicicletas

O diretor-geral da Associação de Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), Thiago Benicchio, avaliou que o atual Plano Diretor, de 2002, não possui o conceito de mobilidade urbana.

“O plano olhava somente para o trânsito motorizado. As referências à bicicleta são raras e a proposta de construção de 367 quilômetros de ciclovias não saiu do papel”, afirmou. Na opinião de Benicchio, qualquer via poderia ser utilizada por ciclistas, e não somente ciclovias.

A cicloativista Daniela Mattern chamou atenção para a forma como se deram os caminhos para bicicleta na cidade.

“As poucas ciclovias foram pensadas de forma local, como lazer. Não como eixo estrutural que leva grande quantidade de pessoas aos seus empregos, à escola. Esse conceito tem de mudar”, avalia. Ela destacou que a maior parte dos usuários de bicicleta o faz por conta do alto custo da condução no transporte coletivo.