Decisão de juíza de BH sobre chacina de Unaí aumenta sensação de impunidade

Viúva de fiscal do trabalho assassinado há nove anos afirma que remeter processo para Unaí significa a absolvição de suposto mandante do crime

Helba (1ª à direita), viúva de fiscal assassinado, fica decepcionada com a decisão: “E agora, quanto tempo mais?” (Foto: Melissa Bonon/Sinait)

Belo Horizonte – Passados nove anos, Helba Soares da Silva não deixou Unaí. Viúva de Nelson José da Silva, um dos fiscais assassinados a tiros em 2004, ela acreditava que, desta vez, o julgamento seria marcado. Mas a decisão de remeter o processo justamente para Unaí, além de aumentar “a sensação de impunidade, de revolta, de tristeza”, significa praticamente uma sentença de absolvição ao ex-prefeito Antério Mânica, apontado como um dos mandantes do crime. “E agora, quanto tempo mais?”, questiona.

Segundo ela, enquanto grande parte da população “ama” Mânica, os que “odeiam” têm medo do poder do político e fazendeiro. Assim, por “amor” ou “medo”, ele jamais seria condenado em um julgamento na própria cidade. Assim, um júri local não daria em nada. “Basta olhar as fotos nos jornais, a alegria que ele demonstra”, diz Helba em referência à entrevista do ex-prefeito, dizendo que as pessoas em Unaí o conhecem e que em Belo Horizonte divulgam “mentiras” sobre ele. “A única verdade que eu vejo em Unaí é o sangue derramado lá. Esta é a nossa verdade”, reage Helba.

A viúva diz que decidiu permanecer em Unaí “para ver tudo de perto”. “Você não tem vida social. No início, intimidavam muito”, conta.

No ato realizado à tarde diante do Tribunal Regional Federal (TRF), em uma movimentada avenida de Belo Horizonte, Marinês Lima de Laia, viúva do fiscal Erastótenes de Almeida Gonçalves, considerou a decisão da juíza “um balde de água fria”. E acrescentou: “Quero dizer que para a digníssima juíza que estamos indignados com a sua atitude”. “Nossas famílias são simples, trabalhadoras. Merecemos respeito.” Os manifestantes usavam camisas que remetiam ao lema da bandeira de Minas Geras (“Liberdade ainda que tardia”), mas com a palavra “justiça” no lugar de “liberdade”.

O presidente da Associação dos Auditores Fiscais do Trabalho (Aafit) de Minas, José Augusto de Paula Freitas, comentou que o ato seria de coroamento de uma luta de nove anos, com o anúncio da data do julgamento. Tornou-se uma manifestação “não de protesto, mas de clamor por justiça”. Para ele, depois de a legislação oferecer todo tipo de recursos para postegar o processo, no que ele chamou de “artifícios procrastinatórios”, foi a vez de a própria Justiça oferecer um desses artifícios.

“Não podemos tolerar que o mesmo Estado que foi frontalmente atacado deixe essa injustiça se perpetuar”, afirmou o frei Xavier Plassat, da Comissão Pastoral da Terra.