Documentário resgata época de ouro do Rock de Brasília

O músico Dinho Ouro Preto, em cena do documentário “RockBrasília” (Foto: ©Gabriela Brasil/Divulgação) Os fãs de Legião Urbana, Plebe Rude e Capital Inicial certamente irão se divertir e descobrir mais […]

O músico Dinho Ouro Preto, em cena do documentário “RockBrasília” (Foto: ©Gabriela Brasil/Divulgação)

Os fãs de Legião Urbana, Plebe Rude e Capital Inicial certamente irão se divertir e descobrir mais algumas curiosidades relacionadas aos ídolos, no documentário “Rock Brasília”, dirigido por Vladimir Carvalho, que estreia na próxima sexta-feira (21) nos cinemas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte, Salvador, Campinas e Santos. O filme, premiado como melhor documentário no Festival de Paulínia deste ano, é divertido, e alguns depoimentos já são inesquecíveis, mas não espere nada mais de um documentário hesitante no momento de definir um estilo.

Na virada dos anos 70 para os 80, num Brasil marcado pela ditadura e repressão do regime militar, vários jovens, filhos de diplomatas e de professores, moradores de Brasília e influenciados pelo punk inglês, se reúnem para tomar vinho, conversar e escutar muita música. Assim nascia o que ficou conhecido como Turma da Colina, em função do nome dos prédios universitários da capital federal. 

Esse é o começo de “Rock Brasília”, que, nesse primeiro instante, mistura depoimentos exclusivos dos hoje homens maduros e dos pais deles com outros do arquivo do falecido Renato Russo e reconstituição histórica, ao som de um trecho do ótimo livro, nunca lançado, de Dinho Ouro Preto, a respeito do período. Em meio a essa história, há também o aparecimento da banda Aborto Elétrico, formada a partir do encontro dos irmãos Fê e Flávio Lemos com Renato Russo. A família Lemos ganha finalmente o destaque merecido nessa história. 

Há ali referências ao modelo de comportamento desses jovens, as brigas e as discussões. O depoimento de Renato Russo a respeito da participação na oração coletiva proposta por Yoko Ono após o assassinato de John Lennon é fantástica, assim como o de J. Pingo, que realiza um espetáculo que conta com um sopão sendo preparado no palco e a participação do Aborto Elétrico. Também é interessante observar o encontro dos filhos de professores com os filhos de diplomatas e o impacto provocado pelas apresentações improvisadas da banda em então moleques como o próprio Dinho e Dado Villa-Lobos.

Simultaneamente ao aparecimento de uma nova banda punk na cidade, a Plebe Rude, o Aborto Elétrico se desfaz, originando a Legião Urbana, liderada por Renato Russo, após um período como Trovador Solitário, e o Capital Inicial, dos irmãos Lemos e do vocalista Dinho Ouro Preto. É nesse momento que o regime militar dá seus últimos sinais de forte violência, o que fica claro nas imagens do Congresso Nacional cercado e o depoimento do general Newton Cruz. É nesse instante que o rock de Brasília rompe as barreiras da cidade, primeiro nas páginas da revista “Pipoca Moderna”, graças ao velho amigo de todos eles, o hoje antropólogo Hermano Vianna – num depoimento delicioso –, e depois no primeiro show fora da capital, em Patos de Minas (MG), para onde o vocalista da Plebe, Philippe Seabra, retorna para contar como tudo aconteceu.

A partir daí, o documentário se divide em contar o choque geracional desses jovens roqueiros e os pais deles, por meio dos vários depoimentos das mães de Renato Russo e Philippe Seabra, e do pai de Fê e Flávio Lemos; e demonstrar o surgimento da popularidade das três bandas, ressaltando, novamente de forma merecida, a importância dos Paralamas do Sucesso. Herbert Vianna e Bi Ribeiro moraram em Brasília antes de partirem para a capital fluminense.

Outro destaque é o momento em que o filme relata com muitos detalhes o show tumultuado da Legião Urbana no estádio Mané Garrincha, em Brasília, em 1988; e do Capital Inicial lotando o Ministério das Esplanadas, em 2008. Porém, nesse momento, que o documentário que parecia contar a história da Turma da Colina se perde em meio à tentativa de mostrar a relação entre os roqueiros e os pais deles – o final constrangedor é totalmente dispensável –; e um choque geracional na música brasileira – as caras de Chico Buarque e Caetano Veloso diante da apresentação da Legião Urbana no programa “Chico & Caetano” falam por si só, o que torna o depoimento de Caetano também desnecessário e fora de propósito.

Desse modo, era esperado de um documentarista com a importância de Vladimir Carvalho, responsável por clássicos como “Conterrâneos Velhos de Guerra”, de 1991; e “Barra 68”, de 2000, algo muito mais consistente do que “Rock Brasília”, que soa inseguro e sem um objetivo muito bem definido. O filme o tempo todo parece hesitante entre definir um estilo e qual história pretende contar. Se é a da geração de Brasília da virada dos anos 70 para os 80; das três bandas principais, Legião Urbana, Plebe Rude e Capital Inicial – que, aliás, é o que representa o cartaz do filme, e o que deve atrair boa bilheteria. Ou se é a do conflito de gerações entre pais e filhos e no seio da própria música popular brasileira. Para atingir esse objetivo, no entanto, era necessário contextualizar o rock brasileiro da época, o que não acontece. Nesse caso, seria interessante também descobrir o impacto dessa geração roqueira de Brasília na seguinte, constituida por artistas como Cássia Eller e bandas como Raimundos.

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