inexistência de justiça

Expedientes para prender Lula são opção pela barbárie

Autoritarismo e a forma absolutista de ação estatal têm sido a tônica da Lava-Jato e revelam a diferença entre um regime democrático e uma ditadura

VITOR TEIXEIRA

DCM – A irresponsável e ardilosa autorização dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para que Moro determinasse a prisão do ex-presidente Lula, antes mesmo de esgotados os seus recursos legais contra uma decisão condenatória, vai muito além do caso concreto e coloca o Brasil na mais profunda barbárie social.

O sistema de justiça criminal brasileiro tem por base parâmetros e princípios que estabelecem regras para a ação estatal e são justamente essas regras que protegem o indivíduo contra o arbítrio do Estado. A inexistência de regras ou o desrespeito a esses pressupostos para a ação estatal é o que diferencia um regime autoritário de um democrático.

Tenho denunciado desde sempre que a opção pelo autoritarismo e por uma forma absolutista de ação estatal tem sido a tônica da Operação Lava-Jato. No entanto, o STF, que deveria ter como função a de corrigir e fazer cessar o arbítrio, tem optado, pela maioria dos seus membros, por referendá-lo. A ilusão vendida por alguns meios de comunicação e seus ventríloquos ministros é a de que essa ação se restringe somente aos processados e condenados pela Lava-Jato. Ledo engano.

Pesquisa da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, enviada ao STF, revela que pelo menos 13.887 mandados de prisão foram expedidos pelo Tribunal de Justiça paulista, após a decisão de fevereiro de 2016, que permitiu a prisão em segunda instância sem trânsito em julgado.

Da mesma forma, a restrição do habeas corpus pelo STF e STJ tem contribuído para a perpetuação de erros judiciários e injustiças. Pesquisa realizada pela FGV revelou que dos habeas corpus impetrados pelas Defensorias Públicas de todo o país entre 2008 e 2012, 66,4% têm a ordem concedida perante o STJ e 43,2% perante o STF.

Ou seja, os ministros que votaram pelo ultraje ao princípio constitucional da presunção de inocência não poderiam alegar ignorância, pois os dados estatísticos estão aí à inteira disposição deles e de suas assessorias. Quando eclodiram as trágicas rebeliões nos presídios brasileiros no início de 2017, enviei ofício à presidenta do STF questionando justamente se havia, por parte do Supremo, estudos sobre os impactos sociais e orçamentários da decisão sobre a presunção de inocência no sistema de justiça criminal. Até hoje não recebi qualquer resposta. O que torna evidente a irresponsável opção pela barbárie.

Resta claro que os expedientes do relator Edson Fachin — que desrespeitou o princípio do juiz natural — e da presidenta do STF — que se nega a pautar as ADCs sobre o tema — adotados para aprisionar o ex-presidente Lula tinham um claro e único objetivo que é o de interferir no processo político e eleitoral brasileiro para tentar banir a maior liderança popular da nossa história. Mesmo que ao custo de jogar milhares de acusados, condenados e encarcerados na mais completa barbárie social.

*Publicado originalmente no Globo