Merval Pereira e o elitista jornalismo da Globo

Chega a ser hilária uma coluna de Merval Pereira no jornal “O Globo” narrando seu “contato” com um grupo de populares que na sexta-feira (1º) faziam um protesto – diga-se, […]

Chega a ser hilária uma coluna de Merval Pereira no jornal “O Globo” narrando seu “contato” com um grupo de populares que na sexta-feira (1º) faziam um protesto – diga-se, aproveitando a presença de Dilma Rousseff – em frente ao Museu de Arte do Rio de Janeiro, inaugurado na sexta-feira.

A narrativa é de quem acha o contato com o povo tão estranho quanto um encontro com ET’s, com a diferença que, neste caso, o personagem humano teme visivelmente ser abduzido….

Os manifestantes não foram lá por causa do Merval, obviamente, e sim por causa das autoridades presentes. Havia um grupo reivindicando solução para o problema dos teatros fechados no Rio após o incêndio na boate de Santa Maria-RS, cujo alvo era o prefeito Eduardo Paes (PMDB-RJ) e o governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ), e outro contra a Medida Provisória dos Portos, cujo alvo era a presidenta Dilma.

Em resumo, Merval narra que manifestantes o reconheceram, chamaram-no de ‘FDP’ e fecharam o trânsito em frente a seu carro, batendo no vidro e gritando palavras de ordem. Disse que foi seu momento ‘Yoani Sanchez’. Sua narrativa, apesar de querer horrorizar, deixa claro que não sofreu nem viu nenhuma agressão física, nem dano material (o que não era mesmo acontecer; seria condenável, antidemocrático e contraproducente como protesto).

O que se percebe é que, mesmo querendo se fazer de vítima, o colunista acaba por mostrar seu distanciamento e incompatibilidade com o  povo das ruas – o que é a cara do elitismo que impera nas redações da Globo. E tem gente que ainda crê que ele, Merval, e ela, a Globo, expressam a “opinião pública”.

Mas o que é mais hilariante são as impressões de Merval sobre os manifestantes. A certa altura, ele escreve. “Aparentemente, não havia no grupo nenhum estivador ou operário. Eram todos jovens estudantes com máscaras e cartazes…” Realmente, chega a ser engraçado.

Como Merval imagina que seja um trabalhador portuário de hoje? Será que imagina que seja igual àqueles que faziam parte do imaginário das pessoas no século 19, sem camisa, descalço, maltrapilho, com uma calça rústica rasgada, brutalizado e carregando dois sacos de 60 kg de uma vez?

E será que imagina que “operários”, hoje, não têm dinheiro suficiente para comprar boas roupas e se vestir como qualquer pessoa de classe média, tanto para andar na rua como para ir a protestos?

Esse é o retrato do jornalismo das Organizações Globo. As “notícias” refletem estereótipos do passado e traduzem preconceitos e ideologias dos donos do jornal e seus feitores. Os “formadores de opinião” dos jornalões nem sequer reconhecem o povo brasileiro nas ruas.

Um editor como Merval Pereira, diante do fato noticioso ali na sua frente, não apura os fatos e não manda um repórter apurar. E noticia o fato debaixo de seu nariz como “aparentemente”, em vez de ouvir os manifestantes e noticiar as coisas como elas aconteceram. E assim se faz nossa grande mídia informativa.

Detalhe: o sindicato dos estivadores do Rio fica a cinco quadras do local da manifestação. Até para um jornalista estagiário, é difícil concluir que “aparentemente não havia nenhum deles ali”.